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25 a 39 anos Ensino Médio Completo Escolaridade Estado Gênero Idade Mato Grosso Mulher Cis Parda Raça/Cor

“Estou desempregada e o meu esposo está preso”

Meu nome é Vanderlaine, sou de Cuiabá, sou esposa de um reeducando, ele está  no CRC. é, sem notícias, é,  não entrava nada e nós estamos com o coração muito apertado. Fiquei com o coração muito partido, preocupada sem notícias.

Foi muito difícil, tô desempregada, meu esposo também está desempregado, está preso, perdi na pandemia sim,meu padrasto com câncer e no final ele ficou com covid. Eu fiquei muito  feliz,  porque ele se vacinou, porque eu estava muito preocupada. Eu estou vacinada, esperando a quarta dose e tenho fé que tudo vai dar certo. Vai voltar ao normal.

Relato de Vandirlaine Campos, produzido pela Associação Mais Liberdade para o 2º Edital de Fomento da Memória Popular da Pandemia

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18 a 24 anos Ensino Médio Completo Escolaridade Estado Gênero Homem Cis Idade Mato Grosso Prta Raça/Cor

“A leitura tem me ajudado a passar por esse momento”

Estou recluso no Centro de Ressocialização de Cuiabá. Estou preso há dois anos já aqui no cinema e hoje a pandemia veio. Infelizmente no momento é ruim, no momento que eu estou passando por mais dificuldade é mais a parte emocional. E hoje eu estou é sem as visitas. Assim como os familiares vem me visitar então assim nós está um transtorno mentalmente é ruim , infelizmente mas é nós estamos buscando outros meios. Como eu estou no sistema penitenciário aqui do CRC tenho a biblioteca e eu fiz algumas atividades.

Ressaltando que com restrição nós tá é buscando ler pra tentar fugir um pouco dos familiares pois não tem visita nem de sistema. Então nós está buscando esses mecanismos de leituras, de trabalhos. Que tenham restrição à distância, fiz partes assim e o sistema propõe pra nós. É como a faculdade também nos busca. A estudar também virei a ver o sistema e o mestrado também que fazemos também aqui. Então ela ajuda muito, Conforme essa pandemia tá tão expansiva.

Buscar novas oportunidades

Muitas pessoas morrendo, então nós não conseguimos compreender e entender. A situação mas sempre nós buscamos arrumar uma forma de distração, sempre a leitura. A Bíblia que nós lemos bastante é a forma de buscar a  Deus. É pra forma de esquecimento do mundo lá de fora e dos familiares para não sofrer tanto como nós sofremos tanto aqui nesse sistema. Eu agradeço a Deus, já tomei as duas doses da vacina.

A minha expectativa daqui pra frente é sair daqui e buscar uma ressocialização lá fora, uma qualificação melhor lá fora e buscar uma mudança que esse percurso todo passando aqui dentro do sistema porque eu estou refletindo muito. Queremos a mudança ão só  não só mentalmente e espiritualmente. E graças a Deus o sistema está favorecendo até mesmo  esse mecanismo, com contato com psicólogo entre  outros que ajuda bastante dentro do  sistema.

Relato de Raony Silva, produzido pela Associação Mais Liberdade para o 2º Edital de Fomento da Memória Popular da Pandemia

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25 a 39 anos Ensino Médio Completo Escolaridade Estado Gênero Idade Mato Grosso Mulher Cis Parda Raça/Cor

“Meu esposo está privado de liberdade e eu não tinha notícias dele”

Olá, bom dia, me chamo Patrícia e meu esposo encontra-se privado da liberdade e na época da epidemia foi difícil. Porque foi desesperador a gente não tinha notícia a gente tinha vídeo chamada onde era difícil a gente conseguir fazer.

A gente não obteve a situação dos agentes penitenciários, que eles falavam que era coisa do Estado, então não foi fácil, né? Tiraram a comida, tiraram tudo, todos sabem que a comida que vem não é a comida adequada, né? Não é comida de boa qualidade, porque é muita, comida pra fazer pra muitos presos, então não é fácil.

Até nessa época de agora pro retorno das visitas mesmo a gente tá com a situação privada de tá levando as coisas pra eles estarem se alimentando ou comer alguma coisa diferente, tudo isso tá sendo difícil pra nós agora na epidemia.

Sem poder ver meu marido

E em questão assim dá vacina graças a Deus. Deu tudo certo, meu esposo foi vacinado, mas assim  é muito e em questão assim da epidemia também. Não foi fácil porque veio a epidemia, eu perdi o emprego, fiquei desempregada sofrendo um acidente, agora eu tive no momento agora eu tô usando joelheira. Porque não faço, várias pessoas tem passado por necessidade, fora essas pessoas que que são parente privado, que faleceu, não teve o direito de se despedir do seu próprio familiar.

Então, não foi uma, foi de dez, oitenta pessoas que perderam, os familiares não podem ver. Por estar privado. Então, tudo isso a epidemia trouxe pra nós uma situação muito difícil, uma situação que abalou todas nós. Porque não é fácil, graças a Deus minha esposo não pegou a covid mas alguns companheiros pegaram e não foram um, foram vários, então não foi fácil, então eu sou muito grata a muitas pessoas, a associação que tem nos ajudado.

Tô muito feliz e graças ao meu esposo, foi vacinado, todos os demais que estão com ele foram vacinados. Para todas as pessoas que se encontram privadas, e as pessoas que são que não são as privadas, que são do foro, rever a situação, tudo certinho porque é muito difícil, muito difícil você querer levar uma comida. Não tem condições e agora as coisas que estão voltando…

Relato de Patrícia Machado, produzido pela Associação Mais Liberdade para o 2º Edital de Fomento da Memória Popular da Pandemia

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25 a 39 anos Ensino Médio Completo Escolaridade Estado Gênero Idade Mulher Cis Paraná Prta Raça/Cor

“Não perdi nenhum familiar, mas fiquei desempregada”

Meu nome é Bruna, eu sou esposa de um reeducando que se encontra  aqui do CRC. Começo da pandemia foi horrível, fiquei sem visita, sabe como é que estava. Não podia entrar nada foi muito sofrido você entendeu? Graças a Deus agora deu uma melhoradinha né! No começo sem videochamada, sem notícia, você entendeu, foi muito…

Foi um ano e pouco sem nada, sem direito a nada, a gente não sabia como é que tava, ele ficou doente, emagreceu muito, ai agora a gente tá ajudando ele né, levou remédio né. A videochamada foi muito triste que ele tava muito abatido né, mais no mesmo me fez feliz que eu consegui falar com ele né. Eu perdi o serviço mas, não perdi nenhum familiar, graças a Deus. não afetou nossa família né, mais eu fiquei desempregada né. Tava dependendo de sacolão entendeu, mas graças a Deus tamo lutando vencendo a pandemia.

Relato de Bruna Souza , produzido pela Associação Mais Liberdade para o 2º Edital de Fomento da Memória Popular da Pandemia

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18 a 24 anos Ensino Médio Completo Indígena Mulher Cis Roraima

“Além de estarem presos, eles não falavam português, (…) não sabiam porque estavam isolados”

Meu nome é Deirys Ramos e pertenço à etnia indígena Warao. Sou da Venezuela e durante esse tempo tenho trabalhado como mediadora cultural.

Eu tive Covid-19 e me contagiei no meu trabalho, atuando com migrantes venezuelanos, com meus conterrâneos. Meu trabalho consistia em explicar como fazer a prevenção contra o vírus, mas com a proximidade física que tínhamos diariamente eu acabei tendo Covid-19. 

No momento que peguei Covid-19 eu não me dei conta, pensava que era cansaço por causa do trabalho, mas pouco tempo depois meus olhos já não me deixavam trabalhar porque ardiam muito. Fiz um teste rápido e deu positivo. Nunca imaginei ficar contagiada por Covid-19. 

Eu não me sentia cansada, tinha ânimos para seguir trabalhando. Eu respirava bem e fisicamente não me doía nada, mas não conseguia ver bem e isso me afetou bastante.

Tivemos que estar fechados em um lugar que fazia muito calor e a minha filha de cinco anos se sentia como se estivesse presa. Ela me perguntava se havia feito algo de mal

Isolamento

Como eu estava com Covid-19 e vivia em um abrigo, minha família e eu tivemos que ficar em isolamento. Isso nos afetou bastante, principalmente a minha filha de cico anos porque tivemos que estar fechados em um lugar que fazia muito calor e a minha filha de cinco anos se sentia como se estivesse presa. Ela me perguntava se havia feito algo de mal. Foi muito traumático. 

Ela teve que ir a psicólogos também, chorava bastante e pensava que não gostavam dela por causa do isolamento, porque ainda que não estivesse com Covid-19, como ela estava com nós, ela teve que ficar isolada também. 

Além de nós, outra família estava isolada. Era uma mãe e seu filho que passavam por um periodo e luto por causa da morte do esposo/pai. Eles estavam sofrendo o luto pela morte de um familiar muito próximo.

Além de estarem presos, eles não podiam se comunicar porque não falavam português. Por isso, não sabiam a razão pela qual seu esposo/pai havia morrido e tampouco sabiam porque estavam isolados. Eu tentava explicar, mas a comunicação não era boa. Ao vê-los chorar, minha filha, a mais velha, ficou traumatizada. Ela pensava que as pessoas não gostavam de nós. Foi muito traumático para ela. 

Essa experiência me fortaleceu bastante porque conseguimos atuar rápido. Em menos de três dias soube que tinha me contagiado e tomei as medidas necessárias para evitar mais contágios e superar a doença. A experiência me encheu de muita fé, fé e esperança ao ver que nem minha filha, nem meu esposo apresentavam os sintomas do Covid-19. 

Em alguns momentos eu senti medo de que a doença pudesse ficar mais grave e isso me ensinou a não esquecer das medidas de proteção, de manter sempre a máscara, de respeitar as pessoas que estão com máscara também. Agora entendo  e estou muito feliz de ver que as pessoas usam o álcool gel nas mãos e se cuidam.

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Observação: o relato acima, em português, foi uma tradução livre do relato feito originalmente em espanhol. Abaixo está o conteúdo original.

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“Aparte de estar encerrados, ellos no entendían el portugués.  (…) No sabían por qué estaban aislados” 

Mi nombre es Deirys Ramos y pertenezco a la etnia indígena Warao. Soy de Venezuela y en estos momentos he trabajado como mediadora cultural.

Yo tuve Covid-19 y me contagié en mi trabajo con los migrantes venezolanos, con mis paisanos. Mi trabajo consistía en explicarles cómo hacer la prevención contra el virus pero el acercamiento diario a ellos hizo que yo también tuviera Covid-19. 

Al momento no me di cuenta, pensaba que el cansancio era normal, pero al poco tiempo mis ojos ya no me permitían trabajar, me ardían mucho. Hice la prueba rápida y dió positivo. Nunca imaginé estar contagiada de Covid-19.

No me sentía cansada, tenía ánimos de seguir trabajando.Yo respiraba bien y físicamente no me dolía nada, pero lo en los ojos se me notaban, no podía ver bien y me afectó bastante.

Tuvimos que estar encerrados en un lugar que hacía mucho calor y mi hija de cinco años se sentía como si estuviera presa y me preguntaba si había hecho algo malo

Aislamiento

Como yo estaba con Covid-19 y vivía en un abrigo, mi familia y yo tuvimos que estar aislados. Eso nos afectó bastante, principalmente mi hija de cinco años porque tuvimos que estar encerrados en un lugar que hacía mucho calor y ella se sentía como si estuviera presa, me preguntaba si había hecho algo malo. Fue muy traumático. 

Ella tuvo que estar con los psicólogos también, lloraba bastante, creía que no la querían por el aislamiento, porque aunque no estuviera con Covid-19, ella estaba con nosotros y tuvo que ser aislada también. 

Además de nosotros, otra familia estaba aislada. Era una madre y su hijo que sufrían el duelo por la muerte de su esposo. Ellos estaban sufriendo el duelo de haber fallecido a un familiar muy cercano. 

Aparte de estar encerrados, ellos no podían comunicarse porque no entendían el portugués.  No sabían la razón por la cuál su esposo y padre había muerto y tampoco por qué estaban aislados. Yo les trataba de explicar, pero la comunicación no se daba. Al verlos llorar, mi hija, la mayor, se traumó. Ella pensaba que las personas no nos querían. Fue muy, muy traumático para ella.

Esa experiencia me fortaleció bastante porque logramos actuar rápido. En menos de tres días me di cuenta de que estaba contagiada y tomé las medidas necesarias para evitar más contagios y lograr superar la enfermedad.  La experiencia me llenó de mucha fe también, Fe y esperanza al ver que ni mi hija ni mi esposo presentaban síntomas. 

En algunos momentos sentí miedo a que la enfermedad pudiera agravarse y fue lo que me ha dejado una gran enseñanza: de no olvidar las medidas de protección; de mantener siempre el tapabocas; de respetar aquellas personas que lo tienen. Ahora entiendo y estoy muy contenta de ver que las personas se echan gel en la mano y se cuidan.

Relato de Deirys Ramos, produzido pela Rede Amazoom para o 2º Edital de Fomento da Memória Popular da Pandemia

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25 a 39 anos Ensino Médio Completo Indígena Mulher Cis Roraima

“Tudo da pandemia foi algo alarmante e inesperado para as comunidades indígenas”

Meu nome é Yoli Silva, sou indígena Warao, de Amacuro, na Venezuela, e tenho 34 anos. Faço parte do grupo de Tuxauas aqui em Boa Vista, no abrigo Jardim Floresta.

Vivo no Brasil há três anos, mas em Boa Vista estou há oito meses, desde dezembro do ano passado, quando me transferiram de Pacaraima. 

Tudo da pandemia foi algo alarmante e inesperado para as comunidades indígenas. Algo que nenhum ser humano estava esperando. No início da pandemia, em 2020, foi terrível. O medo consumiu todas as pessoas dentro do abrigo de Pacaraima, onde eu estava com outros indígenas.

Ida a Boa Vista

No dia 15 de abril de 2020, meu pai testou positivo para a Covid-19 e foi transferido de Pacaraima para Boa Vista, no Hospital Geral (HGR). Eu o acompanhei e fui levada para outro alojamento do Exército, onde estavam as pessoas ou familiares que eram trazidos de Pacaraima para cá. 

No abrigo para acompanhante das pessoas contaminadas, em Boa Vista, o exército nos proibiu de irmos à cidade, de fazer compras. Sempre tínhamos que usar máscaras, manter distância. Então nós mesmos começamos a preparar remédios, com as plantas medicinais e limão. Esses medicamentos naturais foram muito bons para curar os sintomas do Covid-19 e eu, graças a Deus, nunca fui contaminada. 

Meu pai ficou 15 dias internado e foi entubado. Eu só soube disso quando tinha voltado a Pacaraima por um tempo para cuidar dos meus filhos que estavam sozinhos. Quando meu pai voltou para casa, ele estava muito magrinho, muito delicado. Ele se cansava muito e tinha dificuldade para respirar. 

Vacinação

Estou vacinada com a primeira dose e me falta a segunda. Minha esperança é a de que tudo melhore, que todos se previnam, tenham um cuidado maior com a saúde.

Relato de Yoli Silva, produzido pela Rede Amazoom para o 2º Edital de Fomento da Memória Popular da Pandemia

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25 a 39 anos Ensino Médio Completo Homem Cis Prta Roraima

“O pior momento da pandemia foi estar desempregado e ver as contas chegarem”

Meu nome é Pierre Laurore, eu tenho 37 anos e sou hatiano. Eu sou estudante de Administração, em Ciências Administrativas na Facukdade Estácio de Sá. 

A primeira coisa que a pandemia mudou em minha vida foi em relação ao meu trabalho. Quando eu cheguei aqui no Brasil, em 2018, regularizei meus documentos e consegui um emprego no hotel Ibis. Com a chegada da pandemia, depois de um ano e seis meses de trabalho, fui demitido. 

Quando eu trabalhava no Ibis, eu conseguia mandar dinheiro para a minha família que ficou no Haiti e quando fiquei desempregado, isso me preocupou bastante. 

O pior momento da pandemia foi estar desempregado, não ter renda e ver as contas chegarem, ver que tenho uma família para sustentar. Isso foi antes da chegada do auxílio emergencial. Minha esposa conseguiu ter o benefício e com os bicos que eu fazia conseguimos ter um alívio em nossas contas.

Hoje estou trabalhando novamente, na recepção do Eco Hotel. Mas demorei um pouco para encontrar trabalho. Fiz trabalhos curtos com vendas, para ter alguma renda. Era um trabalho bastante informal, o que se chama de “bico”. 

Superação da pandemia

Da minha família, apenas eu e minha mãe fomos infectados pelo vírus Covid-19. Tive sintomas leves porque havia tomado a primeira dose da vacina. Ainda preciso tomar a segunda. 

Eu acredito que o mundo vai superar essa pandemia. O Brasil vai superar a pandemia. A mensagem que eu gostaria de deixar é: não deixar de se vacinar porque a vacina ajuda bastante. 

Relato de Pierre Laurore, produzido pela Rede Amazoom para o 2º Edital de Fomento da Memória Popular da Pandemia

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25 a 39 anos Ensino Médio Completo Homem Cis Indígena Roraima

“Nem todas as pessoas se vacinaram. Nossos parentes que fazem parte de missões evangélicas não tomaram a vacina”

Meu nome é Maurício Ye’kwana, sou diretor da Hutukara Associação Yanomami. Sou do povo Ye’kwana, morador da Terra Indígena Yanomami. Tenho 36 anos. 

A pandemia foi o maior pesadelo de todo mundo. Ela chegou a nós indígenas pelos invasores da Terra Indígena Yanomami, que trabalham no garimpo ilegal. Em um segundo momento, o Covid-19 chegou via profissionais de saúde que entram a cada quinzena, a cada mês em nossas comunidades. 

A pandemia nos trouxe um impacto muito grande, alterou o comportamento de toda a comunidade. Nós moramos em casa de família, com todos juntos e tivemos que nos separar para evitar contágio. 

Mortes na comunidade

Em nossa comunidade, quatro pessoas morreram, entre eles dois sábios que tinham idade mais avançada. Nós indígenas não temos o costume de registrar o que se fala, o que acontece. Para nós, quem faz anotações é quem tem preguiça, é quem tem facilidade de esquecer. A pessoa que entende, que sabe, não registra, aprende de memória para justamente multiplicar depois. Então as mortes das pessoas sábias é algo que não se recupera em um curto espaço de tempo. 

Perdemos também profissionais que nós confiávamos, que eram guardas que trabalharam desde 1990. Ficamos de luto, a comunidade geral parou. Ficamos quase um mês sem fazr nada, ser ir para a roça. Temos que respeitar esse processo. 

Quando acontece isso na comunidade, nós não consumimos carne, né?! Essas coisas assim. De peixe também. Tem que ter todo respeito! Ficar de dieta geral.

Vacinação x missão evangélica

Nós acreditamos na vacina. No começo, falaram que a vacina era ilusão, mas depois que todos tomaram a segunda dose da Corona Vac, as mortes cessaram. Aí vimos a importância da vacinação.

Nem todas as pessoas se vacinaram. Nossos parentes que fazem parte de missões evangélicas não tomaram a vacina. Essa corrente negacionista deixa a nossa situação ainda mais complicada. 

Os invasores entram e saem a hora que quiserem de nossas terras. Isso acontece também porque a Funai está parada.

Na pandemia, tudo parou. Só o garimpo que avançou

A pandemia trouxe mais problemas. Houve um aumento de invasores nas Terras Yanomamis e, com o aliciamento de jovens e lideranças para atuarem no garimpo e, os nossos povos ficam ainda mais vulneráveis à Covid-19. Nossos parentes se contaminam no garimpo e trazem a doença para nossa comunidade. 

Os invasores entram e saem a hora que quiserem de nossas terras. Isso acontece também porque a Funai [Fundação Nacional do Índio] está parada. Na pandemia, tudo ficou parado, menos o garimpo ilegal.

“Fora Garimpo, Fora Covid”

No ano passado nós fizemos a campanha virtual “Fora Garimpo, Fora Covid”. Fizemos diversas entrevistas com pessoas que tinham popularidade, convidamos atrizes, atores e pessoas com influência. 

Fui a Boa Vista (RR) e Manaus (AM) para seguir desenvolvendo campanhas contra o garimpo. Quando denunciamos o garimpo, os garimpeiros nos perseguem, aliam nossos jovens para que indiquem onde estamos. Temos que ter bastante cuidado. 

A nossa luta não vai parar. Vamos continuar denunciando o Estado Brasileiro porque ele não tem o mínimo respeito com os povos indígenas

Não podemos abaixar nossas cabeças

Nós sabíamos que a pandemia viria. Nossos pajés sempre diziam isso. E nós, como lideranças, aprendemos com os sábios que não podemos abaixar nossas cabeças. 

Essa doença não era para nós, era para pessoas que não respeitam a natureza. Porém, todas seremos afetadas. Então a nossa luta aqui é chamar a atenção das pessoas que causam a pandemia. Chamar atenção das pessoas do próprio Governo e do Estado também, que é causador de tudo isso que está acontecendo. 

O Movimento Indígena está ativamente defendendo nossos direitos e as nossas conquistas. Os nossos direitos, que sejam reconhecidos pelo Estado, pelo governo próprio também. E a nossa luta não vai parar. Vamos continuar denunciando o Estado Brasileiro porque ele não tem o mínimo respeito com os povos indígenas. O que ele quer é que nos integremos ao Estado, mas nós temos nossa cultura, danças, tradições e não vamos deixar de ser indígenas.

Relato de Maurício Ye’kwana, produzido pela Rede Amazoom para o 2º Edital de Fomento da Memória Popular da Pandemia

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40 a 59 anos Ensino Médio Completo Mulher Cis Parda Roraima

“Minha mãe seguiu o presidente e não se vacinou. (…) tinha 68 anos quando morreu de Covid-19”

Eu me chamo Luciana Lima, tenho 47 anos e sou servidora pública.

Com 68 anos, a minha mãe foi a primeira vítima fatal do Covid-19 em minha família. Foi uma experiência horrível. 

Ela era diabética, gostava de sair e não se cuidou. Ela tratou em casa e quando já estava começando a ter consciência, pegou uma gripe forte e foi internada. Ficou 15 dias no hospital de Campanha de Roraima, conseguiu ter alta, mas ficou abatida, se sentiu fraca e voltou ao hospital. Quando fez os exames, estava com 60% do pulmão comprometido e foi pra UTI. Ela só foi entubada nas últimas horas, quando estava perdendo a consciência, porque não queria passar por esse processo. Ficou na UTI por duas semanas e não conseguiu resistir. 

Eu acabei pegando Covid-19 da minha mãe, quando eu a acompanhava no hospital. Mas foi leve, fui uma pessoa praticamente assintomática. 

No trabalho, alguns colegas morreram. . O primeiro deles morreu bem no começo da pandemia. Era um amigo muito querido por todos, muito amável. Ele acabou morrendo em três dias. É muito triste.

Vacinação

Assim como muitas outras pessoas, minha mãe tinha medo da vacina. A minha mãe seguia o que o presidente dizia e por isso não se vacinou. A gente vê em nosso trabalho, na repartição pública, que muitas pessoas velhas têm medo e não querem se vacinar e tentam fazer tratamento por meio de remédios naturais. 

Temos que nos cuidar, tomar a vacina para não acontecer o que aconteceu com nossos entes queridos que morreram. A pandemia ainda não acabou e temos que ter consciência que é preciso continuar se cuidando.

Relato de Luciana Lima, produzido pela Rede Amazoom para o 2º Edital de Fomento da Memória Popular da Pandemia

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18 a 24 anos Ensino Médio Completo Indígena Mulher Cis Roraima

“A pandemia tirou o meu abraço”

Meu nome é Glauciely Castro, eu tenho 19 anos e sou da etnia Macuxi. 

Quando penso na pandemia, a primeira coisa que me vem à cabeça é a morte da minha tia Margarida. Eu era muito próxima dela e foi muito doído porque foi muito rápido. Um dia ela estava falando que sentia falta de ar e, de repente, foi ao hospital. Lá, ficamos orando por ela, para que ela melhorasse. Porém, veio a notícia de sua morte. Foi muito triste. Ela foi a primeira pessoa que eu perdi!

Eu já tinha pegado Covid-19 e foi horrível. Não conseguia respirar. E a partir de então, vi que em tudo a gente tem que dar valor, até o ar que a gente respira. Quando minha tia estava no hospital, eu pensava: “eu estou respirando e ela está agonizando”. Por isso, eu tenho que dar mais valor para a minha vida.

Tomamos todos os cuidados para não pegar a doença: usava máscaras, quase não saíamos, passávamos álcool em gel em tudo, seguíamos todas as orientações, mas aconteceu.

Eu fico pensando: “meu Deus, pedi tanto por isso?” É assim como outros parentes meus. Mas eu costumo pensar que quando a gente está triste ou com muita raiva, a gente não consegue ver Deus em momento algum. 

Eu fiquei procurando onde me segurar e me segurei na minha fé, em mim mesma. Eu busquei a esperança, acreditar que essa situação possa melhorar.

Luto

Minha tia morreu em um domingo de agosto. Desde então, todos os domingos pensamos nela. Quando eu soube de sua morte, eu soube que nunca mais a vida voltaria a ser como era antes. A gente fica com uma cicatriz, ainda que siga em frente. 

Minha tia amou todas as vezes que podia amar, ela se se jogou na vida. Agora quando eu penso nela, penso em momentos felizes. 

Penso também nos abraços que a pandemia nos tirou. Abraçar era algo que ela gostava muito de fazer e eu não pude abráça-la. O abraço é uma coisa muito importante!

Antes eu conseguia me concentrar nas coisas que eu ia estudar, agora eu perco muito fácil a concentração

Síndrome pós-Covid

Não sei se a gente pode falar que é síndrome pós-Covid, mas depois que tive a doença, fiquei com muita ansiedade. Isso piora e é um cansaço o tempo todo. A gente rende menos do que a gente rendia antes! Antes eu conseguia me concentrar nas coisas que eu ia estudar, agora eu perco muito fácil a concentração. Eu me esforço muito para fazer o meu melhor, mas eu sei que prejudicou de alguma forma o meu rendimento!

Fora Bolsonaro!

O que eu tenho a dizer é: fora Bolsonaro! 

E, também, queria falar que é para as pessoas não perderem a esperança na vida. Nunca todo mundo vai estar totalmente bem, mas é preciso se cuidar. E, se puder, buscar a ajuda de um psicólogo, fazer terapia! Isso é algo que eu quero fazer.

Relato de Glaucielly Castro, produzido pela Rede Amazoom para o 2º Edital de Fomento da Memória Popular da Pandemia