Eu sou Anita de Almeida, tenho 75 anos, sou indígena da etnia Wapichana e estou ao lado da minha mãe. Minha mãe tem 100 anos e venceu o Covid-19.
Ela ficou com Covid-19 em junho de 2020. Teve muita diarreia, febre e cansaço. Eu e minha irmã a curamos com remédio caseiro. Ninguém soube onde ela pegou a doença. Ela não saía de casa. Ela tinha 99 anos quando contraiu a doença e agora ela vai completar 101.
Mesmo vencendo a doença, ela ficou com sequelas: sente muita dor no quadril e toma remédio todos os dias para diminuir essa dor. Além disso, está perdendo a visão e a audição. Buscamos especialistas para analisar sua visão e eles disseram que a retina da minha mãe está comprometida. Ela não vai mais conseguir recuperar a visão.
Além disso, depois que a minha mãe adoeceu, não podemos mais deixá-la sozinha. Contratamos uma menina para fazer almoço, limpar a casa porque minha mãe não pode fazer nada.
Superação: kit Covid-19 e remédios caseiros
Eu também fiquei com Covid-19. Devo ter pego a doença da minha mãe e foi a minha filha que cuidou de mim. Não cheguei a ficar internada. Fui ao médico e ele receitou ivermectina e cloroquina e eu tomei. Mas me curei mesmo após tomar o remédio caseiro. Era uma mistura de sálvia do campo com mel. Também tomávamos, tanto eu quanto minha mãe, água de coco com inhame e maçã. Assim fomos curadas.
Em nenhum momento ficamos tristes porque nós temos um médico que é o médico dos médicos. Em nenhum momento a gente se desesperou.
Mas perdemos muito também. A minha irmã morreu de Covid-19 em 1° de junho. A gente fica triste por perder uma pessoa, um ente querido. Mas minha mãe é forte e hoje estamos aqui.
O jovem não acredita na pandemia
Já tomei a segunda dose da vacina. Temos que acreditar na medicina. Eu conheço gente que não acredita, que não vai tomar a vacina. Meu filho e minha nora pegaram o Covid-19 e mesmo assim se negam a tomar a vacina.
O pessoal que mora aqui não acredita na pandemia. Ignora os hospitais lotados. O povo quer saber de sair, de farrear, de beber e não é assim. Tem muita gente morrendo e o povo não acredita, principalmente a juventude. O jovem não acredita, mas nós temos que acreditar porque essa pandemia ainda não acabou, ainda não passou e temos que nos resguardar.
Relato da mãe
Meu nome é Helena Leocádio da Silva, tenho 100 anos. Fiquei com as cadeiras doendo, depois as costelas. Mas tomei remédio e passou. Quando minha filha morreu, eu senti sua falta. Ainda estou sentindo muito a sua falta. Ela era tão nova.
Meu nome é Glauciely Castro, eu tenho 19 anos e sou da etnia Macuxi.
Quando penso na pandemia, a primeira coisa que me vem à cabeça é a morte da minha tia Margarida. Eu era muito próxima dela e foi muito doído porque foi muito rápido. Um dia ela estava falando que sentia falta de ar e, de repente, foi ao hospital. Lá, ficamos orando por ela, para que ela melhorasse. Porém, veio a notícia de sua morte. Foi muito triste. Ela foi a primeira pessoa que eu perdi!
Eu já tinha pegado Covid-19 e foi horrível. Não conseguia respirar. E a partir de então, vi que em tudo a gente tem que dar valor, até o ar que a gente respira. Quando minha tia estava no hospital, eu pensava: “eu estou respirando e ela está agonizando”. Por isso, eu tenho que dar mais valor para a minha vida.
Tomamos todos os cuidados para não pegar a doença: usava máscaras, quase não saíamos, passávamos álcool em gel em tudo, seguíamos todas as orientações, mas aconteceu.
Eu fico pensando: “meu Deus, pedi tanto por isso?” É assim como outros parentes meus. Mas eu costumo pensar que quando a gente está triste ou com muita raiva, a gente não consegue ver Deus em momento algum.
Eu fiquei procurando onde me segurar e me segurei na minha fé, em mim mesma. Eu busquei a esperança, acreditar que essa situação possa melhorar.
Luto
Minha tia morreu em um domingo de agosto. Desde então, todos os domingos pensamos nela. Quando eu soube de sua morte, eu soube que nunca mais a vida voltaria a ser como era antes. A gente fica com uma cicatriz, ainda que siga em frente.
Minha tia amou todas as vezes que podia amar, ela se se jogou na vida. Agora quando eu penso nela, penso em momentos felizes.
Penso também nos abraços que a pandemia nos tirou. Abraçar era algo que ela gostava muito de fazer e eu não pude abráça-la. O abraço é uma coisa muito importante!
Antes eu conseguia me concentrar nas coisas que eu ia estudar, agora eu perco muito fácil a concentração
Síndrome pós-Covid
Não sei se a gente pode falar que é síndrome pós-Covid, mas depois que tive a doença, fiquei com muita ansiedade. Isso piora e é um cansaço o tempo todo. A gente rende menos do que a gente rendia antes! Antes eu conseguia me concentrar nas coisas que eu ia estudar, agora eu perco muito fácil a concentração. Eu me esforço muito para fazer o meu melhor, mas eu sei que prejudicou de alguma forma o meu rendimento!
Fora Bolsonaro!
O que eu tenho a dizer é: fora Bolsonaro!
E, também, queria falar que é para as pessoas não perderem a esperança na vida. Nunca todo mundo vai estar totalmente bem, mas é preciso se cuidar. E, se puder, buscar a ajuda de um psicólogo, fazer terapia! Isso é algo que eu quero fazer.
Relato de Glaucielly Castro, produzido pela Rede Amazoom para o 2º Edital de Fomento da Memória Popular da Pandemia
Meu nome é Francisco Belchior. Sou autônomo e tenho 63 anos.
A pandemia afetou não só minha vida, como todas aquelas de pessoas mais vulneráveis. No meu caso, ela afetou principalmente a questão financeira. Eu tinha um pequeno comércio e a situação está muito difícil.
Fome
Um dos momentos mais difíceis da pandemia foi chegar em casa e não ter o que comer. Isso aconteceu comigo mais de uma vez e felizmente contei com a ajuda de um amigo.
Além da questão financeira, perdi uma irmã na pandemia e vários colegas. É triste perder um ente querido, da sua família.
A minha mensagem vai para as pessoas que sobreviveram à pandemia. É preciso ser forte porque não é qualquer um que aguenta passar por essa situação.
Relato de Francisco Belchior, produzido pela Rede Amazoom para o 2º Edital de Fomento da Memória Popular da Pandemia
Olá, meu nome é Francivania Leocaldio, tenho 41 anos e sou da etinia Wapixana. Trabalho como auxiliar administrativo e tenho dois filhos.
O principal impacto da pandemia na minha vida foi a morte da minha mãe, em junho de 2021. Ainda que sua morte tenha ocorrido em junho de 2021, ela teve Covid-19 em maio do ano anterior e conseguiu se recuperar. Porém, ela teve várias sequelas e com o tempo acabou não resistindo.
Sua morte mudou totalmente a rotina da família, porque ela era a base de tudo. Ficamos sem chão e ainda estamos encontrando forças para seguir a vida, tentando lembrar dos momentos bons com ela, de seus ensinamentos.
Além da minha mãe, que morreu das sequelas do Covid-19, perdi também um tio. Ele chegou a ser internado, intubado e não resistiu à doença. Isso foi em março de 2021, quando ainda não havia vacinas. Por isso, é importante que haja vacinas para todos, para que essa pandemia acabe logo.
Contaminação
Ainda que só meu tio e minha mãe tenham morrido em decorrência do vírus, em casa todos fomos contaminados e eu fui a que mais sentiu a doença. Eufiquei quase um mês sem andar e por opção, não quis ir ao hospital. Na minha cabeça, ir ao hospital era morrer lá.
Então eu me mediquei com remédios naturais e industrializados. Durante esse tempo, fiquei muito cansada, não aguentava andar, eu me arrastava para ir ao banheiro.
No momento mais crítico, eu me preocupei por meus filhos. Mas, graças a Deus, ainda estou aqui para contar essa história.
Futuro: medos e esperanças
Com a morte de pessoas queridas por causa da doença, passamos a valorizar mais a família. Houve uma união maior entre nós e sempre falamos: “Ninguém sabe o amanhã! Ninguém sabe se vai estar aqui, então vamos viver o hoje!”.
O meu filho mais novo tem seis meses de vida e nasceu prematuro. Meu medo é que, com a volta às aulas, ele possa pegar a doença de alguém, dos outros filhos meus que vão à escola. Se isso acontecer, ele não vai resistir porque o pulmão dele é muito fraco.
Eu penso muito nos meus filhos, já que a criança não sabe o perigo que está correndo. Nós, adultos, ainda nos protegemos com álcool gel, mas não se pode controlar as crianças na escola. Lá elas vão brincar e interagir com outras pessoas e podem ser contaminadas com o Covid-19.
A mensagem que deixo aqui é sobre a importância da vacinação. Só com a vacina todos estarão imunizados.
Relato de Francivânia Leocádio, produzido pela Rede Amazoom para o 2º Edital de Fomento da Memória Popular da Pandemia
Meu nome é Erinelson Valentim, tenho 49 anos e vivo em Roraima. Sou o primeiro sobrevivente do Covid-19 em meu Estado.
Eu sou técnico de radiologia e atendi dois pacientes com sintomas de Covid-19 antes de conhecermos casos da doença do Estado. Uma semana depois, os primeiros casos foram declarados e eu comecei a sentir os sintomas: coriza e dor de cabeça.
Mesmo não querendo, minha esposa me levou ao hospital e não queriam me internar porque não havia testes. Eu piorei e voltei ao hospital e fui internado com urgência., já que 80% do meu pulmão estava comprometido pelo Covid-19. Fiquei 18 dias entubado.
Também sofri uma parada cardíaca e um AVC [acidente vascular cerebral , mas consegui resistir. Fui o primeiro do estado a resistir à intubação e ao vírus.
Depois que saí da internação, fiz duas ressonâncias magnéticas para saber o grau da gravidade que o Covid tinha me deixado. Uma sequela da doença é que passei a ser hipertenso e tomo medicamentos para controlar a pressão.
Passei por dois neurologistas e eles disseram que eu já estava apto a trabalhar. Porém, nos primeiros dois meses eu percebi que não estava bem. Passei setenta dias em casa me recuperando e contei com muita ajuda familiar.
Volta ao trabalho
Mas eu digo com toda sinceridade que eu renasci das cinzas. Depois desses 18 dias que eu passei internado, penso que eu quero trabalhar na Saúde, trabalhar com o público e com o pessoal da Saúde.
Acho importante conscientizar as pessoas de que a pandemia é real, existe e temos que nos precaver. Sou muito grato e agradeço a Deus todos os dias por estar vivo e poder ajudar outras pessoas, que vão precisar do nosso trabalho.
Relato de Erinelson Serrão, produzido pela Rede Amazoom para o 2º Edital de Fomento da Memória Popular da Pandemia
Meu nome é Elen Lorraine Leocádio da Silva, eu tenho 14 anos e sou da etnia Wapixana.
A pandemia chegou de repente. Foi um susto! A primeira coisa que fizemos quando vimos que os primeiros casos de Covid-19 tinham chegado em Roraima foi ir ao interior do Estado para se isolar. Fomos eu e os meus primos e ficamos no interior por cerca de duas semanas.
Não só eu, mas muitas outras pessoas presenciaram a morte de pessoas queridas e, com tudo isso, deveriam ter consciência. A gente vê por aí muitas pessoas que não estão se importando com a pandemia, como se ela não existisse.
Contaminação
Depois desse tempo, voltamos para a cidade porque queríamos voltar às nossas casas. E, quando voltamos, todo mundo pegou Covid-19.
O meu caso não foi tão grave, mas foi forte. Eu fiquei com vários sintomas como dor de cabeça, febre e calafrios. Eu acredito que tenha me contaminado pela minha mãe, que é jornalista e teve que acompanhar a situação da pandemia nos hospitais.
Como todos em casa estavam com Covid-19, minha avó trouxe um chá, um remédio caseiro e foi assim que me recuperei. Porém, outras pessoas da minha família não tiveram a mesma sorte: meu tio e meus avós morreram. Meu tio chegou a ser internado e entubado, mas não resistiu e meu avô morreu recentemente também.
Porém, a morte da minha avó foi a que mais me doeu. É muito difícil a gente perder alguém que ama e a minha avó foi uma das pessoas mais importantes na minha vida. Ela tinha apenas 63 anos, era muito nova.
Não só eu, mas muitas outras pessoas presenciaram a morte de pessoas queridas e, com tudo isso, deveriam ter consciência. A gente vê por aí muitas pessoas que não estão se importando com a pandemia, como se ela não existisse. Talvez porque não tiveram nenhuma perda, porque se elas tivessem perdido alguém, elas teriam mais consciência sobre isso!
Eu acho muito bonito tudo que os profissionais estão fazendo e já vinha pensando em fazer medicina. Depois que a minha avó adoeceu, eu tive certeza que eu queria fazer medicina!
Educação e pandemia
Seguir estudando durante a pandemia, com o fechamento das escolas, foi muito difícil. Praticamente não se aprende nada nas aulas pelo celula. A gente tem aula pelo Google Meet, todos os dias, de diferentes matérias. É uma dificuldade participar das aulas! Eu quase não aprendo nada, mas eu tento. Eu leio muitos livros para tentar compreender a atividade. Estou cursando o nono ano do Ensino Fundamental e as aulas na escola onde estudo voltaram apenas para os anos do Ensino Médio. Houve muitos casos da Covid-19 lá e por isso eles tiveram que fechar a escola. Estudo na Escola Estadual Monteiro Lobato.
No futuro, eu penso em fazer faculdade de medicina! Eu acho muito bonito tudo que os profissionais estão fazendo e já vinha pensando em fazer medicina. Depois que a minha avó adoeceu, eu tive certeza que eu queria fazer medicina!
A esperança está na vacinação
Quando começou a pandemia eu tive muitas crises de ansiedade. Eu não saia, não via pessoas, eu não conversava e isso afetou o meu psicológico. Acredito que muitas pessoas estão passando pelo que eu passei, mas quando todos se vacinarem, esse contexto será minimizado.
Eu já tomei a segunda dose da vacina já. Na minha família nem todos acreditam na vacina. Isso é um problema! A vacina é muito importante em nossa vida e só com a vacinação é que nosso dia a dia vai voltar ao normal. Ainda que minha família não acredite nos efeitos da vacina, eu estou colocando toda minha confiança nela! Espero que a gente possa viver como era antes.
Relato de Elen Lorraine, produzido pela Rede Amazoom para o 2º Edital de Fomento da Memória Popular da Pandemia
Meu nome é Daniela Esther. Eu tenho 49 anos, sou farmacêutica e estudante de jornalismo – estou quase concluindo o curso. Sou servidora municipal e estadual e trabalho em posto de saúde e também na Vigilância Sanitária do Estado.
A pandemia me afetou em todos os aspectos, com exceção do financeiro porque eu sou funcionária pública. Mas, em relação aos aspectos emocionais e estruturais, ela me afetou.
Eu presenciei os primeiros casos de Covid-19. Ainda em fevereiro de 2020, quando fui a Fortaleza (CE) para passar o carnaval eu já previa que essa pandemia chegaria ao Brasil e seria um sufoco.
Ao voltar de viagem, em março do mesmo ano, tivemos o primeiro caso aqui em Roraima. Em maio de 2020, recebi um telefonema de uma tia avisando que meu pai estava com Covid-19 e que não havia vagas no hospital para interná-lo. Meu pai morava em um abrigo de idosos no Rio de Janeiro e ele morreu sem atendimento. Não consegui viajar para ajudá-lo. Eu fiquei desesperada. Nem o direito de viajar e ver meu pai eu tive porque não havia voos disponíveis.
Essa foi a minha primeira perda. Depois, vi pais de minhas amigas e pessoas do meu ciclo de amizades morrerem.
Comecei a ter muita ansiedade e me automedicar achando que os remédios iriam me proteger. Tomei inclusive ivermectina, mesmo sabendo que não tinha efeito algum contra o vírus
Medo da contaminação por Covid-19
Há dois anos eu fiz cirurgia bariátrica e trabalhei durante a pandemia com muito medo, com pavor. Trabalhar no atendimento, recebendo documentos, receita médica, com medo de se contaminar é complicado. Eu passava álcool em gel a todo momento, era quase um TOC [ transtorno obsessivo-compulsivo]. Às vezes eu dormia com máscara de tão acostumada que eu estava a usá-la. Era muita tensão. Eu não sabia se iria sobreviver ou não.
Comecei a ter muita ansiedade e me automedicar achando que os remédios iriam me proteger. Tomei inclusive ivermectina, mesmo sabendo que não tinha efeito algum contra o vírus.
Vacina: menos sintomas e nenhuma sequela do Covid-19
Em janeiro de 2021 eu me vacinei e tomei a segunda dose em fevereiro. E, em junho do mesmo ano, eu peguei o Covid-19. Foi uma situação muito complicada, mas graças à ciência eu não tive sequelas e os sintomas foram mais fracos.
Porém, o isolamento social me causou muita dor, já que a minha vida é muito dinâmica: das 7h às 22h eu faço muita coisa e tive que mudar totalmente esta dinâmica durante os 15 dias de isolamento.
Outras mortes por causa do vírus
Quando voltei ao trabalho, meu chefe, que era um homem sozinho e tinha problemas de diabetes, morreu de Covid-19. Eu acompanhei todo o processo: eu o levei ao hospital e os exames que ele fez. Mas, em uma semana ele estava morto. Eu senti muito a sua morte. Convivia diariamente com ele. Ele tinha 65 anos, praticamente a idade do meu pai, que morreu com 68. Eu sempre dava carona a ele.
Em abril de 2021, o esposo da minha tia mais nova também morreu. Ele não se vacinou porque ainda não havia vacinas para a idade ele. Fiquei muito abalada com sua morte porque ele era uma pessoa de luz. É muito grande a dor de perder uma pessoa pela falta da vacina.
Assim como eu reconheci minhas fragilidades e procurei ajuda, é importante que outras pessoas possam procurar ajuda. É importante conversar, desabafar. E, além disso, é importante se vacinar e conscientizar outras pessoas sobre a importância da vacinação
Retorno ao tratamento psicológico e psiquiátrico
Com todas essas perdas, eu me desestruturei. Fiquei com um nível altíssimo de ansiedade, voltei a beber e a comer – mesmo não podendo por causa da cirurgia bariátrica. Então eu decidi voltar a fazer tratamento psicológico.
Alguns meses depois, em julho de 2021, percebi que o acompanhamento psicológico não era suficiente porque eu estava com depressão. Então fui a um psiquiatra. Conversamos bastante e entrei com medicação para melhorar a ansiedade.
Estou bem melhor e nesta quarta-feira vou tomar a terceira dose da vacina. Estou muito feliz.
A esperança está na vacinação. Com o avanço da vacina, há menos vítimas do Covid-19. Vamos superar, vamos conseguir passar por isso.
Gostaria de dizer que, assim como eu reconheci minhas fragilidades e procurei ajuda, que outras pessoas possam procurar ajuda. É importante conversar, desabafar. E, além disso, é importante se vacinar e conscientizar outras pessoas sobre a importância da vacinação. Temos que ouvir a ciência, ouvir a razão. Vacinem-se!
Relato de Daniela Xavier, produzido pela Rede Amazoom para o 2º Edital de Fomento da Memória Popular da Pandemia
Meu nome é Cássia Andréia, tenho 24 anos e minha etnia é Wapichana. Atualmente trabalho de forma autônoma.
Antes da pandemia, 2020 seria o meu ano. Eu estava trabalhando, iria começar a faculdade de Comunicação Social, tinha planos de tirar a carteira de habilitação e, no futuro, queria comprar um carro. E, de repente, veio a pandemia e vivemos uma situação que jamais pensaríamos em enfrentar.
Meu marido havia feito um empréstimo para eu comprar um notebook e fazer faculdade. Cheguei a ir para a faculdade na primeira semana de curso. Foi a oportunidade de eu conhecer os alunos e professores, conhecer a faculdade. A experiência foi boa. Mas com o fechamento da faculdade, senti um baque.
Com a pandemia, as aulas passaram a ser realizadas de forma remota, com Google Meet, Instagram e WhatsApp e havia muitas reclamações dos alunos por causa da má qualidade do sinal de internet.
Nessa época, fui despedida e minha casa foi roubada três vezes. Foi um prejuízo muito grande. Nesse contexto, eu já não tinha mais condições de continuar o curso. Ficamos com muitas dívidas e ainda não conseguimos comprar novos aparelhos para que eu possa voltar a estudar.
Sei que é errado se automedicar, mas era o único meio que tínhamos para tentar melhorar: os hospitais estavam lotados
Isolamento e infecção por Covid-19
Com a necessidade de isolamento social, minha mãe, minha avó e as crianças que moravam com elas foram se isolar em um sítio. Nessa época eu ainda estava trabalhando para ajudar minha família com as despesas. Pensávamos que essa fase iria passar logo.
Com o tempo e a não melhora da situação, minha mãe e minha avó resolveram voltar para a cidade e minha mãe acabou contraindo o Covid-19. Eu fiquei desesperada porque moramos em casas separadas e eu não podia visitá-la, acompanhá-la.
Ainda que ela não tenha sido internada, ela ficou com sequelas, com muitas dores nas articulações, com muito cansaço. Depois dela, minha avó também pegou Covid-19. Não se sabe como e porque o vírus chegou, não sabemos como ele entra em nosso lar.
Meu esposo é militar e, depois de um tempo, voltou a trabalhar normalmente. Pegava carona com um amigo até que contraiu o vírus do amigo e ambos foram dispensados do quartel para se restabelecerem. Foi então que eu e minha filha nos infectamos. Ficamos isolados e minha mãe jogava medicamentos no portão de casa. Sei que é errado se automedicar, mas era o único meio que tínhamos para tentar melhorar: os hospitais estavam lotados. A gente tomou medicamentos naturais, já que temos conhecimento sobre ervas por sermos descendentes de indígenas.
Demorei uns três meses para me recuperar totalmente. Foi horrível. Eu só ficava deitada e enxergava tudo embaçado. Eu acho que meu porte físico não ajuda muito porque sou gordinha, sempre fui.
Luto
Perdi amigos, pessoas da minha família para o Covid-19 e quando a pessoa morre por causa do vírus não há nem velório. É muito difícil não poder velar o seu ente querido, não poder abrir o caixão. A despedida dura só dez minutos e é de longe.
Minha avó acabou morrendo por causa das sequelas do Covid-19. Após ter contraído o vírus, sua saúde, que antes era boa, já que ela era uma pessoa ativa, foi se debilitando e ela acabou tendo um AVC.
Eu cheguei a acompanhá-la no hospital e, um dia após seu aniversário, começou a sentir dores de cabeça, foi internada no hospital e morreu. Ela tinha 63 anos. Como ela morreu das consequências do vírus, conseguimos nos despedir. Eu organizei o ritual fúnebre da forma como ela queria, com o caixão chique que ela queria, com tudo.
Perdi amigos, pessoas da minha família para o Covid-19 e quando a pessoa morre por causa do vírus não há nem velório. É muito difícil não poder velar o seu ente querido, não poder abrir o caixão. A despedida dura só dez minutos e é de longe.
Minha avó acabou morrendo por causa das sequelas do Covid-19. Após ter contraído o vírus, sua saúde, que antes era boa, já que ela era uma pessoa ativa, foi se debilitando e ela acabou tendo um AVC.
Eu cheguei a acompanhá-la no hospital e, um dia após seu aniversário, começou a sentir dores de cabeça, foi internada no hospital e morreu. Ela tinha 63 anos. Como ela morreu das consequências do vírus, conseguimos nos despedir. Eu organizei o ritual fúnebre da forma como ela queria, com o caixão chique que ela queria, com tudo.
Vacinação
Meu esposo se vacinou antes de mim porque o quartel disponibilizou vacinas. Eu me vacinei mês passado e este mês receberei a segunda dose. No começo eu tive um pouco de resistência em relação à vacina por causa das informações que ouvi, mas eu me vacinei porque eu não quero mais passar pelo o que eu já passei e nem ter que transmitir o vírus para outras pessoas
Futuro
Eu pretendo sim voltar a fazer faculdade, arrumar um novo emprego. A minha perspectiva para o futuro é concluir os projetos que tracei antes da pandemia. Pelo menos um deles eu estou conseguindo finalizar, que é o de tirar a minha Carteira de Habilitação.
Relato de Cássia Andréia, produzido pela Rede Amazoom para o 2º Edital de Fomento da Memória Popular da Pandemia
Meu nome é Carmen Alejandra. Sou venezuelana, tenho 19 anos e faço faculdade de estética e cosmetologia.
Quando soube da pandemia, eu ainda não tinha chegado ao Brasil. Eu tinha 18 anos quando apareceu o primeiro caso de Covid-19 em Boa Vista (RR). Tinha o sonho de fazer uma festa de aniversário muito grande, mas por conta da pandemia, não consegui fazer. Esse foi o primeiro impacto que senti da pandemia.
Eu não sabia da gravidade do assunto, mas quando as pessoas começaram a se infectar e os lugares públicos do município foram fechados eu comecei a me preocupar. Parecia que eu estava vivendo um filme.
Eu fiquei muito triste. Sou uma pessoa que gosta muito de abraçar, que é carinhosa. Gosto de ter contato com outras pessoas e quando soube que já não poderia fazer isso, fiquei triste. Nessa época, pensava que a pandemia duraria uns 30 dias e conforme o tempo foi passando, eu fiquei muito mal psicologicamente
Fiquei muito mal porque eu tinha muitos planos. Eu tinha acabado de fazer dezoito anos, queria fazer vestibular, prestar o ENEM e entrar na faculdade. Eu tinha muitos sonhos, muitas coisas que eu queria realizar e com a pandemia todas as portas se fecharam.
Graças a Deus eu não perdi ninguém, mas ver que outras estavam perdendo seus familiares e amigos mexeu comigo. Aqui em Roraima houve o caso de uma mãe de gêmeos que morreu. O pai das crianças ficou em depressão e os bebês ficaram sozinhos. Ao saber disso, não conseguia mais dormir, não conseguia fazer nada. Foi o pior dia da pandemia para mim.
Eu só comia, deitava, dormia, acordava. Não tinha esperança na vida. Também ficava pensando na cena em Manaus, quando a prefeitura abriu covas porque já não havia lugar para enterrar as vítimas do Covid-19. Ficava pensando nos familiares dessas pessoas.
O que mais me incomodava era ver pessoas fazendo festa. Estamos em um contexto de que uma doença está matando muita gente e havia pessoas organizando festas, sem consciência alguma do que estava acontecendo.
Eu olhava para o céu e ficava pensando: “o que vai ser de mim? O quê que vai ser da minha vida? O quê que vai ser da minha família?”. Eu fiquei me sentindo um peso para os meus pais
Migrantes enfrentam mais dificuldades para encontrar trabalho
Nós que somos imigrantes enfrentamos muita dificuldade para encontrar um emprego. Meu pai só conseguiu trabalho como ajudante de pedreiro e nada mais. Há imigrantes que não têm o que comer. Muitas vezes nossa família tirava do pouco que tinha para ajudar. Foi uma época muito difícil. Só de lembrar eu tenho vontade de chorar. Não havia saída. Eu olhava para o céu e ficava pensando: “o que vai ser de mim? O quê que vai ser da minha vida? O quê que vai ser da minha família?”. Eu fiquei me sentindo um peso para os meus pais.Nessa época eu percebi que precisava de ajuda. Eu sofria de ansiedade antes da pandemia e, depois, desenvolvi depressão. Procurei ajuda em um dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPs) e precisei tomar remédio tarja preta, porque eu estava em uma fase da depressão bem avançada. Com o remédio e o contexto melhor, com o número de mortes diminuindo, eu fui melhorando.
Há muitos jovens que não se vacinaram e eu, como sou jovem, quero conscientizar os outros jovens a se vacinar. Se eles querem voltar para a vida que tinham antes, com festa e praia, é preciso se vacinar
Viva a ciência: vamos nos vacinar
Eu queria primeiramente dizer que eu sou eternamente grata pela Ciência. Graças a Deus a vacina existe. Chego a sorrir porque sei que tem vacina. Eu já me vacinei! Hoje em dia eu estou bem melhor. Graças à Ciência! Estou fazendo faculdade, estou trabalhando. Também me sinto melhor psicologicamente.
Pensando no futuro, acredito que temos que nos conscientizar e entender que a pandemia é um processo e que com a vacina, tudo vai melhorar. Gente, vacinem-se! Vamos nos vacinar!
Desde o começo, quando nascemos, somos vacinados. Isso não impede de pegarmos alguma doença, mas ela não vai ser tão grave. Eu conheço pessoas que depois de se vacinarem pegaram Covid-19, mas não foram pra UTI, não sentiram falta de ar, tiveram sintomas leves.
Eu quero conscientizar as pessoas para que se vacinem. Há muitos jovens que não se vacinaram e eu, como sou jovem, quero conscientizar os outros jovens a se vacinar. Se eles querem voltar para a vida que tinham antes, com festa e praia, é preciso se vacinar.
O recado que eu quero deixar é que as coisas estão melhorando e que precisamos ter esperança. Os dias mais difíceis já passaram e a gente vai conseguir superar tudo isso.
Também quero conscientizar sobre a necessidade de se procurar ajuda. Eu vejo que a sociedade de uma maneira geral tem uma ideia errada sobre os psicólogos e psiquiatras. Muita gente atrela o fato de procurar ajuda e acompanhamento de um psicólogo significa que você está louco. Isso é um erro. Para mim, louco é quem não faz terapia. Com o mundo como está, precisamos cuidar de nossa saúde mental para conseguir ter uma vida mais leve.
Relato de Carmen Alejandra Muñoz Luengo , produzido pela Rede Amazoom para o 2º Edital de Fomento da Memória Popular da Pandemia
Me chamo Dona Fátima, tenho 64 anos e nasci no Igarapé de Nhamundá. Me mudei para Parintins só quando meu pai comprou uma casa. E eu estou aqui até hoje.
Eu tive 10 filhos, mas alguns já são crescidos, então hoje em dia eu tô só com 3 meninas e uma neta. Uma das minhas filhas mora em Manaus, e eu, sempre morei por esse pedaço, conhecido como o reduto do Boi Caprichoso, no lado azul da cidade perto do porto.
Memórias do Boi e da cidade
Contudo, eu não lembro do Boi desde a sua fundação, pois, já pegara aquela animação já andando, no meio do caminho. Antigamente, eu nem me metia nisso, mas, as meninas novas da cidade sempre iam para o Boi, já eu, ficava um pouco de fora. Mas agora, depois de tudo, eu não quero perder nenhum ensaio.
Em algumas memórias, lembro do Boi brincando na rua, na época da lamparina. Era uma briga, tanto que até tinha pedra no meio. A gente andava por toda a cidade, sempre no meio da rua.
Hoje, vou sempre para os ensaios e festas do Boi, principalmente para torcer por ele — inclusive, vou para as festas, mas não danço. Minha filha, Darley, sempre esteve trabalhando nas alegorias do Boi.
Às vezes eu penso sobre outras famílias que perderam entes queridos…
Nestes tempos conturbados, a pandemia levou muito gente, mas, graça a Deus, não levou ninguém da minha família. Às vezes eu penso sobre outras famílias, que perderam seus entes queridos fora da hora, fora do momento — triste.
A minha vida durante a pandemia foi somente em casa. Eu ia para a pia, levava a máscara e álcool em gel, não saía de lá. Quando saia, tomava banho, e sentada, ficava pensando em quem já se foi. A minha mãe partiu durante a pandemia, mas não por conta do vírus, ela se foi por causa de um câncer. Cuidei dela até o final de sua vida, chegando a falecer aqui em casa.
O futuro…
Para o futuro quero assinar a minha carta de aposentadoria, que resta, somente, a minha assinatura para eu já poder receber o meu benefício. Hoje, fiquei com a casa que meu pai comprara. Quero arrumar toda a casa para ela ficar bonita!
Além disso, estou ansiosa para a volta do festival do Boi!
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