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“Não tive Covid, mas perdi amigas, amigos e vizinhos para a doença”

Relato de Eliete dos Santos, produzido pela Organização Olívia Gama para o 2º Edital de Fomento da Memória Popular da Pandemia

Não tive Covid, nem minha família, mas eu perdi muitos amigos, amigas, vizinhos que morreram com Covid, e a gente sofreu muito porque essa doença é um caso sério. Só Deus que pode explicar pra gente. O sofrimento foi muito e para muitas pessoas. Foram muitas perdas e em muitos países no mundo inteiro. Então, não é porque eu não tive Covid, nem minha família, que a gente não sofreu. Eu sofri muito. 

Sou nordestina de Bom Jesus do Gurguéia, no Piauí. Vim para cá trabalhar para os outros. Minha mãe me deixou aqui para trabalhar na casa dos outros. Naquele tempo, era tempo de você ganhar roupa, ganhar calçados,  comida, e trabalhar para as pessoas. Eu vim muito nova. 

O que mais me marcou na pandemia foi ver o sofrimento das pessoas e estar com uma pessoa em um dia, e no outro receber a notícia de que ela estava internada. Quando menos esperava, ficava sabendo da morte da pessoa. De quê? Covid. Então, isso me marcou muito, tanto é que eu não gosto nem de falar porque já me dói o coração, pois sou uma pessoa como açúcar, tudo me desmancha. Essa doença é muito ruim, só Deus quem explica porque ela veio, porque está espalhada no mundo inteiro.

“Estou aprendendo a ler e escrever”

Atualmente, estou feliz porque, graças a Deus, encontrei uma associação, para aprender a ler. Pedi à minha tia para que eu aprendesse a ler e escrever. Porque muitos falam que não sei ler e não entendo nada, que pego os ônibus errados. Quando penso que estou chegando à Brasília, estou chegando à Planaltina. Quando penso que estou chegando em um lugar, estou chegando em outro. Mas, hoje, estou feliz, porque aprendi a fazer meu nome, e nem isso eu sabia.

Graças a Deus tenho o apoio das meninas da associação, da minha tia, da minha professora, que amo de coração, porque ela tem paciência comigo, para me explicar, para me entender. Graças à Deus,  eu quero, eu posso e eu sou. Agora, sou empresária. No entanto, muita gente olhava para mim e pensava: coitadinha, analfabeta e se diz empresária. Então, eu perguntei se elas já viram uma empresária de maquiagem ser analfabeta. As meninas disseram que não, e eu disse que eu era uma. Eu quero, eu posso e eu sou. 

Tem gente apostando nos meus sonhos

A única riqueza que eu tenho é aquele lá de cima. Sou feliz, porque tenho o senhor Jesus comigo, com nós, com todos. Sou maravilhada com o senhor Jesus. Para mim não existe tristeza. E sei, tem gente apostando nos meus sonhos, tem gente apostando em mim. Pois, Lula não sabia ler. Ele veio a aprender depois que ele foi Presidente da República, porque pagou professor particular. Por que eu não posso aprender, não posso ser uma empresária? 

Primeiro vem a saúde, as forças, a força que Deus dá todos os dias para nós vencermos, e ter as mãozinhas para trabalhar. E a primeira vez que vi na minha vida, a tia me falou que eu tinha sido escolhida para maquiar alguém. Então fiquei surpresa, e a professora me respondeu dizendo que estava no curso para aprender a maquiar alguém.

Estou muito feliz. Não tenho explicação de tudo. Não sei ler, não tenho cartão,  não tenho renda, não quero receber benefício do governo, eu quero conseguir as coisas com minhas mãos, as que Deus me deu, pois eu aprendi, já sou uma empresária.  Eu já sou uma empresária e vou mostrar para muitos como uma analfabeta pode. 

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