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“Nunca imaginei que a dona do imóvel onde moro iria pedir uma ordem de despejo”

Beatrys Madelayne conta que durante a pandemia não conseguiu obter renda o suficiente para pagar o aluguel e corre o risco de ser despejada

Sou Beatrys Madelayne, mulher trans branca e trabalhadora sexual. Vou explicar minha situação durante a pandemia.

Com a chegada da pandemia, minha vida mudou. Eu fiquei sem conseguir trabalhar, já que meus clientes ficaram com muito medo de pegar Covid-19. Eu e outras trabalhadoras do sexo que conheço ficamos sem trabalhar. 

Passei por situações muito difíceis,  tendo que vender as coisas de casa para comprar alimentos, pagar meu aluguel e outras contas. Chegou um momento em que eu não tinha mais nada para vender. Hoje, depois de seis meses de aluguel atrasado, a proprietária do imóvel me deu uma ordem de despejo. 

Nessa condição, estou com medo de, a qualquer momento, a proprietária me tirar de onde moro e eu não ter para onde ir. Eu e mais duas amigas trans que acolhi porque, durante a pandemia, elas precisavam de moradia por terem saído da casa de seus familiares.

Tentei alguns benefícios com a ajuda do Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas) da Diversidade para conseguir me sustentar e tentar me estabilizar, mas o que recebo de benefícios hoje não dá para eu matar a fome de todas nós. 

Ainda assim, fico feliz porque, através do Creas, pude resolver um pouco dos meus problemas e até fiz minha retificação de nome e gênero. Isso para mim era uma das coisas mais importantes, algo que sempre sonhei em ter. É um direito garantido a mim!

Graças a essa ONG, hoje, não passamos fome, recebemos mensalmente uma cesta básica e cesta verde, dentre outras coisas necessárias, como produtos de higiene, cobertores, etc.

Rede de apoio

Devido a dificuldades que vieram com a pandemia, pedi ajuda a uma amiga da terceira idade. Ela me apresentou às Tulipas do Cerrado, uma organização não governamental (ONG) sem fins lucrativos que ajuda, cuida e realiza momentos de convivência com as pessoas da comunidade LGBTQIAP+, população em situação de rua e profissionais do sexo do Distrito Federal e do entorno. 

Graças a essa ONG, hoje não passamos fome, recebemos mensalmente uma cesta básica e cesta verde, dentre outras coisas necessárias, como produtos de higiene, cobertores, etc. Eu e minhas amigas adotamos as Tulipas do Cerrado como uma família, é neste espaço onde nos sentimos acolhidas e amadas, onde podemos sempre desabafar e compartilhar um pouco das nossas vidas, seja em relação aos aspectos positivos ou negativos. Esse é um coletivo que vibra com as conquistas que temos. 

Além da ONG Tulipas do Cerrado e do Creas da Diversidade, tive ajuda recebendo alimentos da Casa Rosa.

Graças a Deus não peguei Covid-19, mas, infelizmente, perdi várias amigas próximas. Tudo isso me marcou bastante. Nunca esperei passar por essas situações. 

Em meio à pandemia, uma ordem de despejo

Nunca imaginei que a dona do imóvel onde moro iria pedir uma ordem de despejo. Até a pandemia chegar eu sempre tinha sido uma boa inquilina e agora, que fiquei em uma condição financeira péssima, ela me trata como se eu fosse lixo. É muito desumano.

Posso concluir essa narrativa dizendo que a pandemia só não mudou quem sou. A minha essência não mudou: eu continuo sendo parceira, sincera, acolhedora. Porém, percebi que as pessoas à minha volta mudaram bastante, ficaram amargas, desunidas.

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