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“Empatia: cuidando do outro estamos ajudando a nós mesmos”

Eu sou uma pessoa que ama a vida, tenho empatia e acredito que eu vim com uma missão. Me chamo Iara, e este nome é dado às mães. Então, eu acredito que vim para cuidar das pessoas. Muitos me chamam de altruísta, mas altruísta ou não, eu sei que vim com uma missão.

Durante esse processo que está acontecendo com toda a humanidade, muita coisa mexeu comigo. Nós, seres humanos, temos o compromisso, um com o outro, de cuidar do outro, em todos os aspectos e ter empatia. Muitas pessoas tiveram surtos e acredito que deveriam disponibilizar psicólogos e terapeutas para mostrar os cuidados e como lidar com a pandemia.

E sabendo que nós somos produto do meio, temos também de nos adaptar, principalmente na questão da higiene, pois nossas vidas foram fortemente impactadas. Eu me coloquei na posição de ajudar. Coloquei à disposição o meu número de telefone para que as pessoas possam entrar em contato comigo para conversar. Já cheguei ao ponto de ter que chamar uma moto ou um carro para providenciar os medicamentos necessários para pessoas doentes, porque elas não teriam como comprá-los.

Porque devemos ter empatia

A gente precisa fazer alguma coisa pelo outro. E essa questão das pessoas dizerem que não tem ajuda governamental não interessa, pois o mais importante é que a gente possa fazer algo pelo outro, independente de termos ajuda. E se dividirmos o que temos, a gente vai viver bem melhor. Pois esta pandemia veio justamente em um momento em que as pessoas estavam extremamente desgarradas. É como se tivesse perdido o amor um pelo outro.

Essa situação ao mesmo tempo tem unido as pessoas, que estão dando mais atenção a quem está na rua com fome, a quem está nu, a quem está precisando de medicamentos. Estamos fazendo muito e eu quero continuar fazendo a minha parte, porque isso é com Deus.

A partir do momento que estamos ajudando o próximo, estamos ajudando a nós mesmos. Eu, mesmo apresentando problemas de saúde (tenho 10 parafusos em minha coluna), não me sinto impedida de pensar que existem problemas maiores lá fora, muito maiores que os meus. Precisei até acolher pessoas de outros países em minha casa que estavam sendo escravizadas. Enfim, uma série de problemas. Pessoas que vieram do interior, com parentes aqui internados e que não tinham onde ficar, e eu acolhi.

Ajudar nunca é demais

E é assim: a gente toma conta da gente e toma conta do outro. A gente faz o que tem que ser feito é não ter e tem que ter para dar. Ajuda nunca é demais, e o que a gente precisa fazer de melhor é isso, é
olhar o outro como um todo, estando no lugar dele. É você ter estar ao lado de fora de um hospital com um paciente lá dentro e não poder entrar, mas ter alguém para lhe dizer: “olhe, eu estou aqui”.

Eu faço isso mas não quero nada em troca. Estou fazendo isso porque é de mim, é minha índole, e espero que isso tenha sido de grande valia.

Para finalizar, que isso não se mantenha apenas durante a pandemia, pois nossa vida já foi modificada. A partir do momento em que tudo isso mudou a nossa vida, a gente também precisa mudar. Mudar nossos conceitos errôneos em pensar em não ajudar para não virar um circulo vicioso. Não, se a gente tem roupas nós oferecemos roupas; se a gente tem alimentos, a gente vai oferecer alimentos, e assim sucessivamente porque a vida vai continuar.

E nós estaremos diferente por ter sofrido essas agressões, mas temos que cuidar. E a palavra de ordem é gratidão, empatia e e cuidado. A partir do momento que acende uma luz, eu estou iluminando o meu próprio caminho.

Eu sou de Logun Edé, espiritualista ecumênica oriunda do candomblé da nação Angola e com raízes na Casa Branca, sou neta de Julieta Alves de Oxum, ladê Durvalina da Anunciação de Oxóssi. 

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“Não podemos perder mais pessoas por causa de fome e frio”

Não quero aceitar que vamos perder mais pessoas por causa de fome e frio. Em pleno dia da semana, a imagem mais dolorosa que vi em 2020: Tudo fechado e ruas lotadas, às 7 horas da manhã, na esquina da igreja Santana. Muitas pessoas, uma atrás da outra, em uma fila que não tinha fim, cruzava a esquina e descia a Cruzeiro do Sul. A maioria, composta por homens negros, aguardava por um pão e um copo de café.

Eu já tinha passado ali muitas vezes. Trabalho com a população de rua há 10 anos pelo SUS e quando saio do plantão faço sempre esse caminho. No meio da multidão muitos rostos conhecidos e de muita gente que nunca vi. 

Estava tão frio, acredito que era o dia mais frio do ano. Senti vergonha, abaixei a cabeça e passei por eles, com a sensação de impotência. Passando perto de quem estava descalço naquele frio horroroso, senti vergonha de estar calçada.

Eu sempre me revolto com o mundo, e quanto mais estudo mais a ignorância deixa de me proteger. Não aguento sentir a desigualdade social aumentar.

Solidariedade

Vejo a vulnerabilidade social como um problema de todos. Por isso, acionei alguns amigos e lá fomos nós para as ruas alguns dias depois. Daquela realidade que me assombrou, a união levou comida, roupas, cobertores, máscaras, descartáveis água, lanches e doces em uma comitiva de 5 carros Muita gente envolvida! E foi assim que conheci mais pessoas que também realizam esse trabalho, e de forma organizada. Fui até inserida em um grupo de WhatsApp, em que os coletivos e religiosos se organizam. Através de uma planilha, cada um vai anotando aonde e que horas vai fazer a ação.

Povo do axé com o povo do amém, em um único lugar, todos pelo mesmo objetivo, e no maior respeito. Essa galera não deixa na mão. Já fui buscar doação em todos os tipos de residência, mó galera diversificada, esforçada e importante. Tenho certeza que, por eles, ninguém passaria fome e frio. A galera sem teto os chamam de boca de rango, sempre envolvidos com falas de carinho e um momento de escuta prazerosa… essa galera é sem palavras, sempre correria!

Sou redutora de danos, a fome é um dano que dói, que desorienta, que desorganiza a pessoa, sei bem como é a dor da fome e por isso não consigo passar sem ver. Muitos falam que é uma fraqueza minha, “ser muito boazinha”, mas nessa pandemia utilizei todas as minhas forças. Não consegui parar nem por um dia. O cansaço bateu por diversas vezes, mas a cada dia agradeço a Xangô, que me guia, e sinto esse Axé em mim.