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60 anos ou mais Ensino Médio Incompleto Escolaridade Estado Gênero Idade Mulher Cis Paraná Parda Raça/Cor

“Sou benzedeira e precisei me isolar durante um mês, devido à Covid-19”

Eu sempre atendia as pessoas e preparava remédios, garrafas, xarope, pomada, para as pessoas que chegavam no portão, mas precisei me isolar por um mês porque peguei Covid-19. Assim que a doença passou voltei a atender a população, porque foi muito triste ver as pessoas naquele estado.

Lembro que quando tive Covid, foi bem triste, porque fiquei afastada de tudo, das pessoas, não podia visitar nem ser visitada. Tinha que ficar em isolamento por muito tempo e só podia sair pra fazer algumas compras, e voltar logo pra casa.

Eu sempre usava álcool e máscara para benzer as pessoas, que também entravam com máscaras. No entanto, no mês de maio, só benzia de longe. Pois, eu já estava  vacinada com a segunda dose. Agora tomei, depois que melhorei, a vacina da gripe. Já estava vencendo os seis meses para eu tomar a terceira dose da CoronaVac.

E estou querendo voltar a trabalhar de novo com as benzedeiras e começar a fazer as reuniões. Durante a pandemia, perdemos muitas benzedeiras, algumas faleceram e outras não puderam atender mais por serem idosas. Muitas famílias não queriam ver suas avós sob riscos de infecção.

Por fim, não sei o dia de amanhã, mas eu tenho ensinado as pessoas a fazerem pomada, tintura, remédios. Mas, o benzimento ninguém quer aprender a fazer. Acho que essa prática um dia vai se acabar.

Relato de Dona Agda Cavalheiro, produzido pela Instituto de Educadores Populares para o 2º Edital de Fomento da Memória Popular da Pandemia

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18 a 24 anos Ensino Médio Completo Indígena Mulher Cis Roraima

“Além de estarem presos, eles não falavam português, (…) não sabiam porque estavam isolados”

Meu nome é Deirys Ramos e pertenço à etnia indígena Warao. Sou da Venezuela e durante esse tempo tenho trabalhado como mediadora cultural.

Eu tive Covid-19 e me contagiei no meu trabalho, atuando com migrantes venezuelanos, com meus conterrâneos. Meu trabalho consistia em explicar como fazer a prevenção contra o vírus, mas com a proximidade física que tínhamos diariamente eu acabei tendo Covid-19. 

No momento que peguei Covid-19 eu não me dei conta, pensava que era cansaço por causa do trabalho, mas pouco tempo depois meus olhos já não me deixavam trabalhar porque ardiam muito. Fiz um teste rápido e deu positivo. Nunca imaginei ficar contagiada por Covid-19. 

Eu não me sentia cansada, tinha ânimos para seguir trabalhando. Eu respirava bem e fisicamente não me doía nada, mas não conseguia ver bem e isso me afetou bastante.

Tivemos que estar fechados em um lugar que fazia muito calor e a minha filha de cinco anos se sentia como se estivesse presa. Ela me perguntava se havia feito algo de mal

Isolamento

Como eu estava com Covid-19 e vivia em um abrigo, minha família e eu tivemos que ficar em isolamento. Isso nos afetou bastante, principalmente a minha filha de cico anos porque tivemos que estar fechados em um lugar que fazia muito calor e a minha filha de cinco anos se sentia como se estivesse presa. Ela me perguntava se havia feito algo de mal. Foi muito traumático. 

Ela teve que ir a psicólogos também, chorava bastante e pensava que não gostavam dela por causa do isolamento, porque ainda que não estivesse com Covid-19, como ela estava com nós, ela teve que ficar isolada também. 

Além de nós, outra família estava isolada. Era uma mãe e seu filho que passavam por um periodo e luto por causa da morte do esposo/pai. Eles estavam sofrendo o luto pela morte de um familiar muito próximo.

Além de estarem presos, eles não podiam se comunicar porque não falavam português. Por isso, não sabiam a razão pela qual seu esposo/pai havia morrido e tampouco sabiam porque estavam isolados. Eu tentava explicar, mas a comunicação não era boa. Ao vê-los chorar, minha filha, a mais velha, ficou traumatizada. Ela pensava que as pessoas não gostavam de nós. Foi muito traumático para ela. 

Essa experiência me fortaleceu bastante porque conseguimos atuar rápido. Em menos de três dias soube que tinha me contagiado e tomei as medidas necessárias para evitar mais contágios e superar a doença. A experiência me encheu de muita fé, fé e esperança ao ver que nem minha filha, nem meu esposo apresentavam os sintomas do Covid-19. 

Em alguns momentos eu senti medo de que a doença pudesse ficar mais grave e isso me ensinou a não esquecer das medidas de proteção, de manter sempre a máscara, de respeitar as pessoas que estão com máscara também. Agora entendo  e estou muito feliz de ver que as pessoas usam o álcool gel nas mãos e se cuidam.

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Observação: o relato acima, em português, foi uma tradução livre do relato feito originalmente em espanhol. Abaixo está o conteúdo original.

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“Aparte de estar encerrados, ellos no entendían el portugués.  (…) No sabían por qué estaban aislados” 

Mi nombre es Deirys Ramos y pertenezco a la etnia indígena Warao. Soy de Venezuela y en estos momentos he trabajado como mediadora cultural.

Yo tuve Covid-19 y me contagié en mi trabajo con los migrantes venezolanos, con mis paisanos. Mi trabajo consistía en explicarles cómo hacer la prevención contra el virus pero el acercamiento diario a ellos hizo que yo también tuviera Covid-19. 

Al momento no me di cuenta, pensaba que el cansancio era normal, pero al poco tiempo mis ojos ya no me permitían trabajar, me ardían mucho. Hice la prueba rápida y dió positivo. Nunca imaginé estar contagiada de Covid-19.

No me sentía cansada, tenía ánimos de seguir trabajando.Yo respiraba bien y físicamente no me dolía nada, pero lo en los ojos se me notaban, no podía ver bien y me afectó bastante.

Tuvimos que estar encerrados en un lugar que hacía mucho calor y mi hija de cinco años se sentía como si estuviera presa y me preguntaba si había hecho algo malo

Aislamiento

Como yo estaba con Covid-19 y vivía en un abrigo, mi familia y yo tuvimos que estar aislados. Eso nos afectó bastante, principalmente mi hija de cinco años porque tuvimos que estar encerrados en un lugar que hacía mucho calor y ella se sentía como si estuviera presa, me preguntaba si había hecho algo malo. Fue muy traumático. 

Ella tuvo que estar con los psicólogos también, lloraba bastante, creía que no la querían por el aislamiento, porque aunque no estuviera con Covid-19, ella estaba con nosotros y tuvo que ser aislada también. 

Además de nosotros, otra familia estaba aislada. Era una madre y su hijo que sufrían el duelo por la muerte de su esposo. Ellos estaban sufriendo el duelo de haber fallecido a un familiar muy cercano. 

Aparte de estar encerrados, ellos no podían comunicarse porque no entendían el portugués.  No sabían la razón por la cuál su esposo y padre había muerto y tampoco por qué estaban aislados. Yo les trataba de explicar, pero la comunicación no se daba. Al verlos llorar, mi hija, la mayor, se traumó. Ella pensaba que las personas no nos querían. Fue muy, muy traumático para ella.

Esa experiencia me fortaleció bastante porque logramos actuar rápido. En menos de tres días me di cuenta de que estaba contagiada y tomé las medidas necesarias para evitar más contagios y lograr superar la enfermedad.  La experiencia me llenó de mucha fe también, Fe y esperanza al ver que ni mi hija ni mi esposo presentaban síntomas. 

En algunos momentos sentí miedo a que la enfermedad pudiera agravarse y fue lo que me ha dejado una gran enseñanza: de no olvidar las medidas de protección; de mantener siempre el tapabocas; de respetar aquellas personas que lo tienen. Ahora entiendo y estoy muy contenta de ver que las personas se echan gel en la mano y se cuidan.

Relato de Deirys Ramos, produzido pela Rede Amazoom para o 2º Edital de Fomento da Memória Popular da Pandemia

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40 a 59 anos Branca Homem Cis Paraná Pós-Graduação Completa

A saudade de visitar era maior que o risco

Com a pandemia, a saudade das visitas e dos olhares dos pacientes era grande.

Sou perito contador e advogado, funções que mesmo antes da pandemia já possuíam a característica de ser um trabalho solitário.

 Durante esse isolamento, o trabalho  foi me consumindo e, se tornando, uma das únicas atividades do meu dia.

A saudade de visitar crescia

Por outro lado, crescia em mim a vontade de poder estar em contato com pessoas, e poder contribuir, de alguma forma, com um trabalho solidário.

Eu já realizava esse trabalho em um ONG, atuando como palhaço em hospitais. Porém, como voltar aos hospitais nesse momento, se eles eram o olho do furacão?

A esperança de poder visitar

Por mais que ainda hoje não tenhamos uma data prevista para o fim desse momento delicado em que vivemos, nunca deixei de acreditar que esse período conturbado da pandemia, fosse acabar.

A ONG continuou firme com os seus objetivos e, em parceria com os hospitais, encontrou uma forma de continuar presente na rotina dos pacientes.

 Algo que, antes, era realizado presencialmente pelos voluntários da ONG, passou a ser feito de forma remota, com o auxílio de um robô, que era guiado por um assistente do hospital até os quartos dos pacientes.

A partir disso, conseguimos continuar a interagir com um dos nossos principais públicos-alvo.

Adeus, saudade

A atividade fim da ONG não deixou de ser cumprida, mas agora a forma era bem diferente.

Durante esse período, tive o prazer de acompanhar o crescimento de diversos amigos que lhe tomaram essa missão, e a desempenharam incrivelmente.

Eles realmente fizeram a diferença nesse período, tão inusitado. Eu, por outro lado, não consegui embarcar nessa mesma onda, mas o desejo de continuar atuando como palhaço não diminuiu nem um pouco.

A pandemia ainda não acabou, e precisamos continuar com todos os cuidados e protocolos de proteção, mas já conseguimos ver uma luz no final do túnel.

O tempo continuou passando dia após dia, por vezes, de forma bem lenta, e a esperança de voltar a atuar nos hospitais parecia algo muito distante.

Foi então que, de repente, li em nosso grupo de mensagens, que teríamos a oportunidade de voltar a estar presentes em um dos nossos hospitais parceiros.

Na hora, o coração acelerou muito, acompanhado de uma sensação de desespero só por lembrar que eu não estava em dia com os meus estudos da palhaçaria.

Isso tudo foi agravado, pois, o evento aconteceria no local onde estou lotado como voluntário (meu querido Hospital do Idoso).

Ao ler a postagem, tomei ciência de que o evento para o qual fomos convidados, ocorreria durante a semana, em horário comercial, o que diminui a quantidade de voluntários disponíveis.

Apesar de continuar ativo na ONG ajudando em rotinas administrativas, a vontade de voltar a visitar era absurda.

A maioria das conversas em tempos de pandemia, giram em torno de um só assunto: será que já estamos seguros para voltar a nos encontrar?

A saudade e o reencontro

O evento foi realizado no auditório do hospital, e contou com a presença de diversas pessoas, sendo nossa função, recepcionar esses participantes.

Assim que coloquei os pés no hospital, as lembranças dos diversos momentos ali vividos começaram a visitar a minha memória.

É incrível como aquilo que nos faz bem, volta com uma força gigantesca e nos motiva.

No início da preparação, as mãos estavam trêmulas pela falta de prática em arrumar o figurino, fazendo a preparação demorar muito mais do que o normal.

Foi importantíssimo poder contar com a ajuda dos dois parceiros nessa preparação. Enfim, depois do figurino pronto, fomos recepcionar nossos participantes.

A energia que o palhaço carrega dentro de si, é algo incrível. Ela contagia a quase todos por onde passa. É maravilhoso conseguir olhar nos olhos das pessoas e sentir o carinho transbordar.

“Esse período de reclusão nos ensinou muitas coisas, e penso que, uma das principais, é o fato de percebemos que humanos gostam, e precisam, estar com outros humanos.”

A receptividade dos participantes foi espetacular, e mesmo que os jogos e a dupla não tenham apresentado a sua melhor performance, o resultado foi muito bom.

Depois de um bom tempo interagindo com os participantes, finalizamos nossa atuação entregando o auditório para a palestrante principal.

Eu pensava que já tínhamos terminado a nossa participação, quando recebemos mais um convite.

Matando a saudade na ala do hospital

Agora a missão era visitar todas as alas do hospital, convidando os colaboradores a participarem do evento que estava acontecendo, um evento muito importante que trazia várias técnicas que auxiliavam no gerenciamento da dor.

Não preciso nem dizer que aceitamos de pronto. Voltar a entrar nas alas, trouxe-me um misto de emoções, tais como saudade, alegria e euforia.

Durante os caminhos percorridos, foi inevitável olhar para determinados quartos procurando por pacientes que, por diversas vezes, visitamos. Infelizmente ou felizmente, não consegui encontrar ninguém que já conhecia.

Mas também estava curioso para reencontrar a equipe de enfermagem que sempre me recebeu com sorrisos maravilhosos.

Assim que chegamos ao primeiro posto de enfermagem, o astral subiu para as alturas.

Fomos recebidos com muita euforia e a alegria foi se espalhando por todo o ambiente.

De forma natural e harmoniosa, gradualmente, fomos nos comunicando, brincando. Era como se o tempo não tivesse passado.

Após visitar vários postos de enfermagem, com muita interação, nos despedimos, e fomos ao Centro de Terapia Intensiva.

O reencontro na CTI

O Centro de Terapia Intensiva é um local de cuidados especiais, onde, geralmente, os pacientes ficam por um longo tempo, apenas com a companhia da equipe hospitalar.

Nem sempre é possível termos contato com esses pacientes, seja devido ao seu estado de saúde, pois vários estão desacordados, seja por inspirarem cuidados muito especiais, sem que a aproximação seja possível.

Nessa nossa visita, ao adentrarmos o CTI com todas as precauções possíveis, fomos direto ao posto de enfermagem convidar os colaboradores, e fomos mais uma vez recebidos com sorrisos e com muito carinho.

A grande surpresa veio quando eu já estava saindo. Ao me despedir dos colaboradores, quando me virei para sair do CTI, meu olhar cruzou com uma paciente que estava acamada em um dos leitos.

 A conexão dos olhares foi instantânea. Naquele momento, a minha conexão com o meu parceiro de visita se quebrou e me concentrei naquele olhar. Ela me olhava de um jeito tão especial que me prendia em seu olhar.

Não tinha como não retribuir aquele sorriso e aquele olhar. O reflexo foi imediato e, mesmo estando a uma certa distância física, comecei a retribuir com olhares e gestos de carinho.

Novamente, pude comprovar que a palavra e a fala, não são as únicas formas que temos para nos comunicarmos.

Não sei precisar exatamente o tempo que essa conexão durou, mas tenho a certeza de que as trocas de olhares e os gestos de carinho que trocamos alimentaram nossos corações e tornaram nosso dia mais alegre.

E que saudade que estávamos desse reencontro

O tempo de duração não foi grande, mas a intensidade foi gigantesca. Despedi-me dela com vontade de continuar ali por mais tempo, mas meu parceiro de visita já estava saindo e não podia deixá-lo mais sozinho.

E foi assim que me despedi e retomei a minha visita. No fim, embora a visita não tivesse o objetivo de interagir com os pacientes, acabei me conectando com vários.

Sei que ainda não há previsão de retorno da visitação aos pacientes, mas essa pequena visita me fez sentir, mais uma vez, o quanto é bom poder atuar como palhaço no ambiente hospitalar.

Agora, é retomar as minhas rotinas de estudos da palhaçaria e esperar que, em breve, eu possa voltar à rotina de visitas.

Agradeço aos meus parceiros de visita, ao Hospital do Idoso Zilda Arns, por nos proporcionar esse momento, e agradeço especialmente a todas as pessoas que interagiram conosco com tanto amor e carinho.  


Relato produzido pela Associação Nariz Solidário para o 2º Edital de Fomento da Memória Popular da Pandemia

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40 a 59 anos Branca Escolaridade Estado Gênero Idade Mulher Trans Pós-Graduação Completa Raça/Cor Santa Catarina Sem categoria

“A Covid-19 fez com que sentíssemos medo de todos, até dos amigos e parentes”

A vacina chegou bem na época da minha mudança para Santa Catarina. Então fiz 534 km de volta para ser vacinada. Sai às 5 horas da manhã e cheguei em Portão às 14h30. Fui direto tomar a vacina: foi tanta alegria que não senti nada. Minha expectativa para o futuro é que tenhamos um governo que preze pela vida e pelo social e que olhe para todos.

Na verdade, ficamos com medo uns dos outros – era esse o sentimento que eu tinha – até dos amigos e dos parentes. A gente tinha medo de se encostar, de se aproximar. Foi um período muito triste… nojo e medo foi o que mais senti. …Isso fez que refletíssemos sorbe o que realmente e a resposta foi a vida, a saúde, a família, a liberdade.

Outra coisa marcante foram as filas nas portas dos supermercados, coisa nunca vista. E a neurose em limpar as compras, limpar as mãos, trocar de roupas e de calçados a cada vez que sair na rua. Foi estressante, ainda é, pois não estamos livres da contaminação. Parece um filme de ficção científica.

Famílias puderam fortalecer seus laços, enquanto outras não suportaram as suas diferenças e se desconstituíram. O que todo mundo sente falta é de abraço, de aconchego, de aglomeração e de proximidade – coisas que tínhamos, eram comuns, mas nem dávamos tanta importância. 

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Estado Gênero Mulher Cis Paraná

“Durante o isolamento, vi o quanto o ser humano é importante”

Quando chegou essa pandemia, foi uma relação de todos nós, do mundo todo, acabamos nos afastando, e durante o isolamento vi o quanto o ser humano é importante. Pois em nossa vida, o que é importante é ser solidário. Se um estiver caindo, segurar pela mão, é repartir o pouco que temos para conseguirmos ter uma boa vivência.

A pandemia chegou e rompeu a antiga dedicação de promover eventos durante doze anos. A nossa luta da Reforma Agrária ensinou sobre a transformação da sociedade. Ensinou a ir atrás de nossos objetivos, ser humilde com as pessoas, lutar por igualdade para todos e a ser uma família.

Nossa vivência ficou muito restrita, pois estamos no isolamento para proteger os nossos. Porque para nós, o ser humano, está em primeiro lugar. Nós que estamos acampados temos uma vivência muito perto e muito unida. Se um vizinho tivesse uma dor de cabeça, nós também a sentíamos, pois isso a Reforma Agrária ensinou a nós. O espaço onde vivemos ensinou que nós temos que sentir a mesma dor, pois nós estamos acampados atrás dos mesmo objetivos.

Convivência x Isolamento

Antes do isolamento, tínhamos um calendário de nosso convívio em nosso espaço social. Nos somávamos com outras comunidades aos sábados para um Bingo. Todas as famílias estavam presentes neste mesmo espaço, onde nós mesmo construímos, onde nós mesmos fizemos a doação de nossas prendas. Então era uma relação de harmonia com as famílias.

Após a pandemia, quebrou tudo isso. Nós não conseguimos fazer a festa junina, nós não conseguimos fazer uma formatura para nossos filhos. Várias coisas se perderam durante esse período.

Então para as mulheres foi muito mais difícil, pois acabaram sendo mães, pais, professoras (para ajudar seus filhos a ter um estudo digno). Mas não temos esta formação, e não estávamos preparadas para isso.

Então, neste período, somos muito mais forte do que ser mãe, do que ser só mulher, do que ser só militante desta organização. Procuramos ter mais habilidades, ser mais amorosas, mais dedicadas, ser forte, guerreira de verdade, para atravessar este momento… Ajudar na produção alimentar da casa, e para a grande doação de alimentos até mesmo para cidades, temos que ser ser humanas, e nos fortalecer ainda mais. Pois a pandemia mostrou a carência que um vizinho, por exemplo, tem. E essa pandemia veio para mostrar isso.

Sou Cláudia, estou acampada no Acampamento Herdeiros da Luta de Porecatú, da região Norte do Paraná. Há 12 anos estamos nesta área ocupada por 250 famílias.

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25 a 39 anos Escolaridade Estado Gênero Idade Mulher Cis Pós-Graduação Completa Prta Raça/Cor Rio de Janeiro

“A pandemia mostra a face da desigualdade social no país”

Moradores de favelas se organizam para suprir as suas próprias necessidades, mas o governo escolheu flexibilizar colocando em risco toda a população

O novo coronavírus (Covid-19), infelizmente, chegou e vem mostrando durante todo esse ano a face da desigualdade social e do racismo enfrentado historicamente pela população que habita nas favelas e periferias do país.

No Rio de Janeiro é cada vez maior o número de casos confirmados e veiculados pela Prefeitura do Rio, mas sabemos que não é o real, já que os números continuam subnotificados. Sabemos que os testes feitos na rede pública não atende a toda população e a maioria das pessoas que conseguem é porque pagam pelo teste na rede privada.

O fato é que quem vive nas favelas já sabia o quanto sofreríamos com a pandemia, já que é neste local que há ausência de qualquer tipo de direitos. A própria saúde pública ainda é um direito a ser conquistado por essa população empobrecida.

Desde o final de 2019, por exemplo, foram diversos os postos de saúde e clínicas da família fechados, profissionais da saúde foram demitidos ou tiveram cortes salariais, deixando inúmeros favelados e periféricos sem atendimento na atenção básica.

Tem gente passando fome

Com a recomendação do Ministério da Saúde e da Organização Mundial da Saúde (OMS) para que toda a população fique em casa e siga as orientações do isolamento social para a diminuição da transmissão do vírus, fez outra necessidade da favela gritar, a fome. Ou seja, esta população se viu num beco sem saída: ou continua tentando trabalhar diante de uma pandemia colocando a própria vida e de seus familiares em risco; ou fica em casa, mas sabendo que vai faltar a comida, o gás, a verba para o pagamento das contas, dentre diversos outros problemas.

Para suprir parte dessas necessidades, esta mesma população tem enfrentando filas dos bancos em busca do auxílio emergencial, nem todos conseguiram se cadastrar, nem todos receberam. E quem recebe, sofre agora com a ameaça de não ter mais esse apoio emergencial por causa dos cortes do governo. Diante de tantos problemas que esta população vem passando, é dever de toda a sociedade apoiar a favela na cobrança de direitos e cuidados por parte do poder público.

A favela vem em todo esse ano tentando se organizar com campanhas de comunicação para prevenção, além da busca de doações de alimentos e materiais de higiene para sobreviver. Mas com a flexibilização ordenada pelos governantes, as doações só caíram e, infelizmente, o nosso povo está sofrendo com estas e outras necessidades como trabalho, recursos, alimentos, remédios, água, habitação, saneamento, dentre diversos outros problemas nunca antes garantido pelas autoridades e que neste ano de pandemia, tudo só fez piorar e deixar velado a face da desigualdade social brasileira.

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40 a 59 anos Ensino Médio Completo Escolaridade Estado Gênero Idade Minas Gerais Mulher Cis Prta Raça/Cor

“Projetos foram engavetados por causa da pandemia”

A gente precisa se adequar até quando as medidas sanitárias forem necessárias, tomando as devidas precauções mesmo com relação aquelas pessoas com as quais convivemos.

No meu caso, convivo com minha mãe e com meu irmão que são cardiopatas e hipertensos e também trabalho na área da saúde. É um momento que precisamos ter muita perícia, temos que ter muita cautela para lidar com a situação. É preciso saber direito o que pode e o que não pode.

Evitem sair, saiam apenas nas extremas necessidades. É um momento é realmente muito difícil, porque rouba da gente aquele hiperativismo que a gente tem em relação à nossa vida particular, pessoal, trabalhos em comunidade…

Enfim, são tantos projetos que ficaram, de certa forma, engavetados devido à chegada da pandemia. Mas a gente vai fazendo o que precisa ser feito para que a gente possa vencer essas dificuldade, porque em nome do senhor Jesus Cristo isso vai chegar ao fim.