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“O mais difícil foi ser cobrada pelas contas, e não ter como trabalhar”

Relato produzido pela Organização Olívia Gama para o 2º Edital de Fomento da Memória Popular da Pandemia

O mais difícil foi receber faturas, contas a pagar, como o aluguel da casa, sem poder trabalhar. E agora, de onde é que você vai tirar? Foi muito complicado. Teve uns quatro meses que o Auxílio Emergencial me ajudou. Meu namorado me ajudava também, senão não tinha nem como pagar o aluguel. Reabrimos o negócio, se não me engano, em junho ou julho. 

Graças à Deus,  ninguém da minha família pegou a Covid, e isso é o mais vitorioso. A pandemia afetou mesmo nos compromissos no dia-a-dia. Mas, estando com as coisas em dia, é outra coisa. Agora, se não estiver, você fica doida. Não sei se todos pensam igual a mim, mas eu penso assim. O que vale é você honrar os compromissos.

O governo não deixou de nos enviar os boletos de cobrança durante a pandemia

Nós ficamos aqui um tempão e o governo não deixou de nos enviar os boletos, e todos nós tínhamos que pagar e isso afetou muito. Não tivemos nem um mês em que não tivéssemos que pagar os impostos. Mesmo fechados, tivemos que pagar todos os meses e não deixar nenhum atrasar.

Apesar de tudo, a gente tem que pensar em dias melhores. Correr atrás, batalhar, para ver se vêm dias melhores, pois se ficar assim, a gente não consegue nada. Eu corri atrás de dias melhores, pedi a Deus para ver se melhora, porque a cada dia as coisas vão ficando mais difíceis. 

Se vamos ao mercado com R$50, a gente não volta nem com o real de troco mais. Pior: nem compramos o que a gente quer. Está mais difícil por isso. Com uma família de duas ou três pessoas em casa, é preciso saber se organizar, senão a gente passa dificuldades. Quando se é só, dá pra se virar. Mas, se duas pessoas em casa já é difícil, imagina uma família de treze filhos. 

Comecei a trabalhar em Brasília no mesmo ano em que cheguei

Meu nome é Cristina Maria Brito dos Santos, tenho 55 anos. Trabalho aqui na feira desde 1993, e moro no Recanto.  Sou do Maranhão.  Estou em Brasília desde 14 de julho de 1993. No mesmo ano em que cheguei,  comecei a trabalhar. E até hoje estou aqui.  Minha mãe mora no Maranhão com meus dois irmãos. No total, somos treze irmãos. Não sou a caçula,  mas sou a antepenúltima. Ainda têm mais dois depois de mim. Um irmão e uma irmã. Todos os dias converso com eles.

Nesse contexto, não consegui visitar a minha família, porque minha mãe é idosa, tem 93 anos, e a gente preferiu deixar passar um pouco de tempo para ir lá, por causa da Covid. Estou esperando, e agora neste mês de Janeiro quero ir, com fé em Deus. Vai fazer dois anos que não vou por conta da pandemia. Espero que esse negócio já tenha passado até lá. Ela é preferencial, então não tem nem como sair para ir pra lá. Eu preferi ficar, e também pela situação. Ficamos quase sete meses sem trabalhar e aí como é que viaja? Não tem nem como. Financeiramente, não tem nem como viajar.

Relato de Cristina Maria, produzido pela Organização Olívia Gama para o 2º Edital de Fomento da Memória Popular da Pandemia

 

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“Todas as pessoas do meu quilombo estão vacinadas!”

Graças ao divino Espírito Santo inventaram a vacina e todas as pessoas do meu quilombo estão vacinadas. Não via a hora de tomar a vacina, pois nela eu tinha a esperança do fim da pandemia. Hoje, estou vacinada com as primeira e segunda doses, graças a Deus.

Não tivemos problemas para a vacina chegar até a nossa Comunidade Quilombola do Forte Príncipe da Beira, com exceção do meio de transporte para cidade mais próxima, a Costa Marquês. Porém, no meu quilombo, tem um quartel do exército com atendimento médico e, em caso de emergência, acabavam levando as pessoas nas viaturas para a cidade.

Somos uma comunidade pequena, no entanto, muito unida. Lutamos juntos pelos direitos do nosso quilombo.

Na foto, é possível ver Nucicleide da Paz dentro de casa mostrando cartão que comprova o recebimento da vacina contra a Covid-19.  Imagem acompanha o relato: "Todas as pessoas do meu quilombo estão vacinadas!"
Nucicleide da Paz apresenta comprovante do recebimento da vacina contra a Covid-19

Com a chegada da pandemia, as crianças ficaram sem estudar. Os pequenos não podiam sair de casa. E o medo da infecção é uma das coisas mais ruins trazidas pela Covid-19. Tivemos que aprender e a lidar com a doença, que mostrou que para morrer infectado é indiferente ser rico, pobre, negro ou branco.

Acredito que aprendemos amar, ter mais respeito e compreensão com o próximo, pois não sabíamos o que seria do amanhã.

Não há mais casos de Covid no meu quilombo

Não há nenhum caso de Covid-19 na minha comunidade e, graças a Deus, não faleceu ninguém por causa dessa doença. No entanto, o período de pandemia pra mim foi muito difícil. Tive depressão e não saia de casa. Por outro lado, nos unimos ainda mais na minha comunidade.

Não perdi ninguém da minha família. Todavia, a minha mãe pegou Covid-19. Ela tem 54 anos. Cheguei a pensar que a perderia para essa doença, pois ela ficou muito mal. Então, pedi proteção ao senhor divino Espirito Santo e redobrei os cuidados com ela. Ainda bem, não fui infectada.

Por fim, a minha amada mãe se recuperou, está vacinada e muito bem de saúde. Deixo aqui o meu conselho a você que lerá o meu relato: vacine-se. Não esqueça a segunda dose nem a de reforço. A pandemia ainda não acabou, e precisamos unir forças para que esse período termine logo e possamos voltar à normalidade.

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“Para mim o mais difícil é ficar longe de quem a gente ama”

Nesse sistema de saúde precarizado, eu como profissional de saúde tenho que dar o meu melhor, mas como mãe também quero estar com minhas filhas, tentar protegê-las. No entanto, o meu trabalho é extremamente necessário no momento. 

Sinto medo, mas preciso estar preparada o suficiente para cuidar das pessoas. É uma insegurança muito grande de chegar um paciente e eu não conseguir fazer nada. Porque com a Covid-19 todo dia é um aprendizado novo, e nenhuma certeza do resultado do que está sendo feito, o que estamos ofertando é pouco diante do gigante que só cresce.

A saída de casa é sempre uma triste despedida. Eu saio de casa na segunda-feira, às 5 horas da manhã. Então, no domingo à noite já chamava minha filhas para conversar, por que era muita insegurança, incerteza. Só de falar já da um nó na garganta, passa um filme na cabeça.

Eu ouvia as pessoas falarem “Helida, vem para casa. Você tem a Thaisa que tem só 2 anos e 10 meses. Tua filha é pequena!”. Sempre há aquela preocupação de se contaminar no trabalho, mesmo sem apresentar sintomas, porque existem os assintomáticos. Mas o trabalho não pode parar.

Amor e cuidado

Então eu sempre segui todos os protocolos de segurança, usei muitas mascaras durante o dia, acho que fui umas das profissionais que dei um grande gasto de materias para o município. Volto para casa no fim de semana seguindo um ritual de: ao chegar em casa, ir direto pra lavanderia, deixar toda a roupa de molho, tomar banho e só depois encontrar minhas filhas.

Nesse momento é uma felicidade, estar viva e estar voltando para casa, olhando as pessoas que mais amo bem. Enfim, com aquela sensação de dever cumprido.

Momentos mais difíceis foram os que fiquei longe das pessoas que amo: mãe, irmãos, minha avó que tem 87 anos. Minha mãe só pude ver depois de 90 dias, era uma saudade gigante, mesmo com as diferenças o medo de perder essas pessoas fez repensar muita coisa, creio que não só a mim, mais acho que é o pensamento da humanidade hoje, a gente passa a valorizar o que antes era irrelevante, como um simples telefonema, uma conversa. Isso ajudou muito a diminuir a saudade mais não era o suficiente.

Tivemos uma diminuição dos casos e o afrouxamento das regras e cuidados, e novamente os noticiários já falam em aumento de casos, e nós continuamos despreparados, já vimos uma doença parar o mundo e não sabemos o que nos espera no futuro, a única esperança é uma vacina que possa nos proteger. Foram muitas vidas perdidas, famílias que praticamente acabaram e até o momento nenhuma certeza de nada. O medo retorna mais uma vez.