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Um mergulho musical na UTI

Enquanto a psicóloga hospitalar nos conduzia a bordo da ‘Covidina’ (manequim adaptado para visitação remota do Nariz Solidário), para fazermos um mergulho musical na UTI. Cantávamos ao som de ‘Kazoo’, com um pandeiro e com os sons produzidos em nosso próprio corpo.

Adentrando na UTI

Tivemos uma percepção nítida do impacto do palhaço na UTI, ainda que de forma remota. Ali, do outro lado da tela, profissionais exaustos, com seus múltiplos EPIs, proporcionando-nos apenas um contato com os olhos e sua expressão corporal.

Em um determinado momento, em resposta ao nosso completo desajuste e desafinação de nosso mergulho musical — sorriram, cantaram e dançaram conosco.

Foi quando nos deparamos com um desafio: esquecemos aquela música grudada em nossa cabeça desde dezembro do ano passado, quando cantamos no mergulho musical. Depois de algum esforço — “meu coração, não sei por que, como é grande, o meu amor, por você!”


Relato produzido pela Associação Nariz Solidário para o 2º Edital de Fomento da Memória Popular da Pandemia

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Visitamos uma princesa

Sou voluntário na Associação Nariz Solidário, onde trabalho como palhaço em hospitais de Curitiba e região. Há cerca de um ano e meio que não sentíamos mais a energia e o amor das visitas presenciais, dos encontros, olhares e sorrisos.

De volta aos hospitais..

No mês de outubro voltamos para a nossa rotina de visitas aos hospitais. No meu primeiro dia foi difícil conter as emoções geradas pelos risos e olhares nos corredores do hospital.

Entrando nos quartos, não conseguia conter a vontade de passar pelos batentes das portas e me mudar para lá, ficar com as crianças até elas melhorarem e irem para casa.

“De palhaços para alteza”

Palhaço Frutoso e palhaça Jupira em um quarto no Hospital em Curitiba (PR).

Batemos em uma das portas para ver se podíamos entrar. Surpreendemo-nos com um olhar calmo, de uma moça que abriu a porta bem devagar para nós. Ao entrar, vimos uma princesa sentada em sua cama, com um arco que se parecia muito com uma coroa, ruiva, lembrando aquelas princesas da Disney.

Será uma princesa?

No início, ela estava tímida, e eu, na característica do Palhaço Frutuoso, ao lado de minha colega, Danila (Palhaça Jupira), começamos a conversar com ela, dizendo termos achado uma princesa.

Conversamos sobre a história de reis e rainhas, e seus olhos, sorriram por trás da máscara, como se sua alegria tivesse se transformado em um grande conto de fadas. Ao sair, descobrimos que quem abrira a porta havia sido a rainha, a mãe da nossa querida princesa. Reverenciamos a majestade e, ao fechar a porta, pudemos ouvir risos que ecoaram pelas paredes rochosas do castelo.


Relato produzido pela Associação Nariz Solidário para o 2º Edital de Fomento da Memória Popular da Pandemia

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“Eu também me questionei”

Durante esse período e até agora, pergunto-me se tem alguém que não tenha questionado a vida, a morte, a passagem do tempo, o valor das coisas; pergunto-me se tem alguém que não questionou seu próprio ofício, suas escolhas, sua estabilidade financeira ou emocional.

Em março de 2020, eu morava fora do Brasil, mas estava constantemente ligada ao meu país através das memórias, do amor e de meu trabalho com a ONG Nariz Solidário.

“Como prosseguir sem me questionar?”

Questionei-me também ‘como prosseguir’ e, principalmente, como eu poderia ser útil para além de minhas próprias buscas pessoais.

Nesse momento, meu amigo Eduardo Roosevelt, do Nariz Solidário, fez-me uma proposta: E se colocássemos em movimento ideias antigas nossas, como o Curso Online “O humor e a Saúde”?

Este curso seria voltado apenas para palhaços de hospital, mas, naquele momento, poderia ser para qualquer um que quisesse aprender!

Pensávamos que, além de ajudar a transformar a vida de outras pessoas, estas atividades poderiam, de certa forma, desacelerar nossa vulnerabilidade e ainda ajudar a ONG Nariz Solidário.

Quais os próximos passos?

Resolvemos fazer esse teste e nos vimos mexidos e modificados com essa experiência.

Pensei que eu iria ajudar, mas fui a maior beneficiada. Pudemos nos conectar com pessoas de todas as idades, em todo o Brasil e, algumas vezes, até pessoas que moravam fora compartilhando experiências íntimas, medos e brincando juntos.

Lembro-me de situações delicadas e especialmente impactantes, como uma das alunas que assistiu alguns dos nossos encontros ao vivo, juntinho com sua mãe, da cama do hospital.

Mandava-nos fotos ou vídeos e nos tornamos tão íntimos nesses momentos, conseguindo nos fortalecer nesse período tão delicado.

Nadja Moraes no curso online "Humor e Saúde", ministrado pela ONG Nariz Solidário.

Foi quando vimos que era possível

É possível, independente das circunstâncias, encontrar um farol de luz, caminhos que nos deem suporte, leveza e alegria, mesmo em momentos de grandes desafios. Mesmo em contato com a morte.

Tivemos uma mãe solo que passava por uma depressão, com uma filha especial, e pudemos ver em primeira mão o seu progresso, sua abertura, sua vontade de viver e de brincar, despertando através de nossas trocas.

Tivemos um palhaço de circo tradicional na ONG Nariz Solidário, com tanto a ensinar, com tanta estrada e picadeiro em suas memórias, aberto para aprender e compartilhar conosco suas histórias.

Ele, que faleceu recentemente, deixou-nos um legado incrível de humanidade. Cada troca enriquece a todos. Eleva-nos e nos mostra que existem caminhos mesmo em meio à dor.

O potencial dessa semente iniciada durante a pandemia só nos mostra que mesmo à distância, é possível construir pontes.

Mesmo na dor, é possível se ver sorrindo e encontrar fagulhas de alento e alegria e contribuir cada vez mais para uma sociedade onde possamos nos ajudar sempre, contar uns com os outros e cuidar de nossas feridas juntos.


Relato produzido pela Associação Nariz Solidário para o 2º Edital de Fomento da Memória Popular da Pandemia