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25 a 39 anos Amazonas Ensino Médio Completo Homem Cis Parda

“A pandemia e a enchente em Parintins nos colocou diante da realidade”

Meu nome é Josias Silva, tenho trinta e dois anos e sou natural de Manaus. Há três anos resido em Parintins e em todos eles tenho me dedicado, exclusivamente, à Associação Cultural Boi-Bumbá Caprichoso.

Durante esse tempo todo, tivemos felicidades e também muita tristeza, com a chegada da pandemia. Ela pegou todo mundo de surpresa. Infelizmente experimentamos mais a dor da perda do que algum ganho. Ficamos de resguardo em nossas casas, praticamente presos, sem poder fazer nada, sem poder respirar. Infelizmente perdemos muitos amigos e familiares. Porém, com a chegada da vacina, tudo pode voltar ao normal. Não totalmente, mas aos poucos a gente vai voltando ao normal. 

Durante a pandemia, ainda com o cenário de mortes, eu pude ter uma felicidade: a chegada da minha filha Luna, que foi o presente que Deus me deu. Ela é o amor maior da minha vida, a maior felicidade que eu tive.

“Essa fama de o Caprichoso ser o “Boi da elite” é falsa. Na realidade, de perto, vimos as dores, as necessidades do povo da nação azul e branca”

De cara com a realidade: pandemia e enchente em Parintins

Em relação ao Boi Bumbá Caprichoso, o que eu tenho a dizer é só felicidade. Porém, enfrentamos a pandemia e a enchente em Parintins e isso nos colocou frente a frente com a realidade do povo Caprichoso. Essa fama de o Caprichoso ser o “Boi da elite” é falsa. Na realidade, de perto, vimos as dores, as necessidades do povo da nação azul e branca. 

Com a enchente e a pandemia, muitas pessoas que trabalham com artes no Boi-Bumbá Caprichoso não puderam elaborar seus projetos e, com isso, não puderam ter dinheiro para sustentar suas famílias. Então o Boi Caprichoso fez várias ações, como o evento do dia das mães e as atividades com o povo que mora na região alagada pela enchente. Levamos o Boi até as pessoas que sofreram com o isolamento da pandemia para dar um pouco de alegria e esperança. 

E como eu falei anteriormente, a vacina nos trouxe esperança. Há pouco tempo, tivemos uma festa no curral do Boi-bumbá Caprichoso. Nela, pudemos extravasar, dizer que, felizmente, a vencemos, estamos vencendo. Foi aquela mistura de sentimentos: ao mesmo tempo em que a gente estava feliz, extravasando, por estar todo mundo vacinado, também sentimos tristeza por aqueles que já não estão com a gente porque morreram de Covid-19.

Eu peço a todos aqueles que ainda não se vacinaram que se vacinem. A vacina é a única esperança que a gente tem para voltarmos à normalidade. Também peço a você que se vacinou que continue se cuidando: dê conselhos para os amigos e familiares que não se vacinaram para se vacinarem. A vacina é a única esperança que temos de dias melhores.

Temos que ter consciência de tudo aquilo que perdemos e deixamos de valorizar para que possamos, novamente, ver o brilho de nossa festa. Temos que dar mais valor aos outros, ter mais amor em nosso coração e união. 

Espero que em 2022 tenhamos vitórias, prosperidade e que seja um ano de vitória também para o nosso Boi-Bumbá Caprichoso, com a realização do Festival, no qual trabalhadores possam voltar aos galpões e levar o sustento para suas famílias.

Volta do Festival só com vacinação

Estou muito feliz por fazer parte dessa família do Boi Caprichoso e só com a vacina podemos realizar o próximo Festival Folclórico de Parintins e, com ele, fazer com que a economia do nosso município volte a crescer. 

Espero que essa vida [de pandemia] tenha ficado para trás e que, com a vacina, possamos ter dias melhores. Espero que em 2022 tenhamos vitórias, prosperidade e que seja um ano de vitória também para o nosso Boi-Bumbá Caprichoso, com a realização do Festival, no qual trabalhadores possam voltar aos galpões e levar o sustento para suas famílias. Espero que seja um ano de muitas vitórias para nação azul e branca.

Por isso, vacinem-se, continuem se cuidando, cuidem de suas famílias, de seus amigos para que a gente possa se encontrar nesse festival de 2022, que promete ser um dos melhores.

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25 a 39 anos Ensino Superior Completo Escolaridade Estado Gênero Idade Mulher Cis Parda Raça/Cor Santa Catarina

“Tenho mais medo da violência do que das doenças”

Acho que hoje tenho muito mais medo da violência do que das doenças. Por sorte, vivemos em um lugar ainda bastante seguro.

Mas meus anseios são quanto à segurança, principalmente com meu filho. Durante a pandemia, eu até certo ponto fiquei tranquila em saber que ele estava ali, dentro de casa, protegido não somente do vírus, mas do mundo.

Consegui me desligar um pouco do mundo e entender um pouco mais sobre o que eu gostava de fazer. A pandemia me trouxe isso, saber o que eu gosto, quais são os meus interesses e as minhas prioridades.

Na pandemia eu me dei prioridade.

É claro que essa doença avassaladora destruiu o emocional da população. Muitas baixas. Mas vejo como um sinal do mundo dizendo: “hei, pessoas, parem, respirem, vejam o céu azul, o vento…”

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25 a 39 anos Branca Mulher Cis Paraná Pós-Graduação Completa Sem categoria

“A pandemia isolou minha gestação”

A gestação de minha filha foi ainda antes de todo esse contexto de pandemia, mas fiquei bastante frustrada por ter que vivenciar algo tão desejado, como a gravidez, em isolamento, distante até mesmo de minha família. Foi, então, que, durante um desabafo com o Eduardo, fundador da ONG Nariz Solidário, ele me provocou dizendo: “você é palhaça, seja criativa!”. Fiquei com aquilo na cabeça e pensava: “mas como?”

Tenho 33 anos, sou pedagoga, contadora de histórias, e trabalho de forma voluntária como palhaça na ONG Nariz Solidário, espaço em que busquei doar meu tempo e que me proporciona crescimento em cada uma das ações.

A arte sempre me colocou sob a necessidade de escutar o outro, mas, primeiramente, precisava ouvir a mim mesma. Foi assim que os treinamentos do Nariz Solidário me ensinaram sobre aceitação pessoal. Entre encontros e oficinas, redescobri a essência de minha palhaça: reencontrei-me enquanto pessoa, reconciliando-me com a minha infância e descobrindo uma nova mulher. Só a partir daí realizei um dos meus maiores sonhos: a maternidade.

Paracegover: Nesta foto, Elenice está sentada na grama ao lado de Eduardo. Ela está de calça preta com bolinhas brancas, usando nariz de palhaço e tiara laranja na cabeça. Elenice veste um top que cobre apenas seus seios e deixa sua barriga amostra. Ao seu lado, Eduardo está agaixado e fitando sua esposa com um largo sorriso no rosto. Eduardo é um homem branco de meia estatura, veste uma camiseta preta, calça jeans, óculos e boina preta.

Mas aí veio a pandemia…

Queria exibir meu barrigão e minha alegria para o mundo e não podia nem sequer sair de casa. Fui refletindo e, um dia, me veio a ideia de fazer autorretratos em casa, para não perder cada fase do crescimento daquela vida que vinha crescendo em mim.

Antes, minha ideia era fazer um book de gestação na montanha, já que sou montanhista e minha gravidez estava tranquila e saudável. Mas, com a necessidade de cumprir com o distanciamento social por conta da pandemia, meu mundo passou a girar em torno de quatro paredes.

Além disso, a provocação de Edu fez surgir em mim a ideia de registrar uma das atividades que compunham parte de meu trabalho remoto: a contação de histórias. Realizava duas vezes por semana lives para crianças da educação infantil e, ao final de cada enredo, eu me fotografava. Foi lindo. Usava figurinos e elementos específicos para cada temática. O tempo passava mais rápido e mais leve. Em agosto de 2020, minha Ana Clara nasceu.

Outro misto de alegrias e dores

Estava muito feliz por, enfim, ver meu bebê. Mas triste por ter que evitar contatos externos. Mesmo durante a licença maternidade, preferi não me afastar da família Nariz Solidário, mantendo contatos remotos, devido à pandemia. E, apesar de ter menos tempo devido às novas demandas exigidas pela maternidade, não abandonei as oficinas oferecidas pela ONG. As aulas trouxeram um sentido para o meu viver, já que, através delas, e por meio da “arte da palhaçaria”, consegui levantar diariamente com entusiasmo para enfrentar os obstáculos do isolamento social.

Com 22 semanas de gestação, hoje, uma nova vida cresce em mim, e sinto-me a pessoa mais realizada do mundo. Tudo isso devo às oficinas do projeto “De Nariz para Nariz”. Ao realizar os treinamentos em casa, brinco com a minha pequena e improviso cenas simples, que me divertem e a fazem rir.

Paracegover: A foto mostra Elenice, uma mulher branca com cabelos curtos de coloração castanha, sentada em uma poltrona, com um violão ao lado. Na parede, há corações rosas colados e um urso panda apoiado  sobre a almofada da poltrona. Elenice veste uma tiara de laço vermelho com bolinhas brancas, mesmas cores de sua camiseta polo. Na foto, Elenice está sorrindo e com a mão apoiada em sua barriga grávida de aproximadamente 5 meses.

Ana Clara tem menos de dois anos, mas sua pureza e encantamento com pequenas coisas a fazem rir de situações que, geralmente, nós adultos, reclamamos. Cada gargalhada que ela solta quando eu bato o cotovelo sem querer na mesa, por exemplo, me permite refletir e fazer daquilo um jogo lúdico, repetindo a ação apenas para ver seu sorriso.

A arte me prepara

A arte me prepara e me ensina. Sua presença em nossas vidas transborda tanto amor, que eu e meu esposo escolhemos ter nosso segundo bebê. Hoje, temos o Francisco a caminho! Nos últimos tempos, aprendi que a vida está aí para ser vivida: intensamente, dentro de qualquer possibilidade!


Relato produzido pela Associação Nariz Solidário para o 2º Edital de Fomento da Memória Popular da Pandemia

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25 a 39 anos Amazonas Ensino Médio Completo Homem Cis Prta

“Com a vacina, o índice de mortalidade caiu muito e já podemos sorrir de novo, fazer a festa para o nosso Boi”

Sou Leandro da Costa Carvalho, conhecido como Lete. Vou contar aqui a minha história. Eu tenho um comércio chamado “Comercial Betão”, que fica no Bairro da Princesa (Parintins-AM), reduto do Boi Bumbá Caprichoso. Tudo estava caminhando bem até a chegada da pandemia. 

Em 3 de março, durante a pandemia, minha mãe, Joana da Costa Carvalho, morreu. Além disso, a pandemia fez com que fossem canceladas duas edições do Festival Folclórico de Parintins. Por dois anos, nós não tivemos Festival. Então, não pude contar com o trabalho que tinha a partir da Festa do Boi. Tive que focar na minha loja. Não foi fácil, já que a Festa do Boi aquece a economia local, movimenta todo o dinheiro do município de Parintins.

Como se não bastasse, em 30 de julho deste ano, houve uma enchente grande no bairro que invadiu a minha loja e tudo ficou alagado. Com isso, a situação ficou ainda mais difícil. 

No próximo ano, esperemos que o Festival Folclórico de Parintins aconteça porque é uma ajuda muito grande para economia do município.

Pós-pandemia e a volta da Festa do Boi em Parintins

Graças a Deus surgiu a vacina. Com a primeira e segunda dose da vacina, o índice de mortalidade caiu muito e já podemos sorrir de novo, fazer a primeira festa para o nosso Boi. Ainda não pude exercer o cargo de diretor comercial, mas já trabalhei na Festa do Boi e consegui arrecadar algum dinheiro e pude investir na minha loja.

Infelizmente, a festa não foi igual às edições anteriores, porque muitos dos nossos amigos já não puderam estar no evento, assim como também a minha mãe, que era torcedora fanática do nosso Boi. Mas nós sentimos muita emoção, vibração. 

Falando da vacina, graças a Deus, todo mundo está se vacinando e já podemos ver por aí muita gente nas festas.

No próximo ano, esperemos que o Festival Folclórico de Parintins aconteça, porque é uma ajuda muito grande para economia do município. Espero que essa pandemia não volte mais e que dê tudo certo para termos nossa vida normal.

Uma lição: A gente tem que mudar, olhar mais para o próximo

O que eu tiro dessa experiência como lição é que não foi fácil você ver gente praticamente passando fome: tinha chamada de doação de rancho, de cestas básicas, da Prefeitura de Parintins até os blocos de carnaval. Do mesmo modo, não foi fácil ver várias e várias casas alagadas. 

Eu tive o prazer de participar de uns eventos de doação de rancho para a população que perdeu muita coisa por causa da enchente, que perdeu parentes. A enchente em Parintins foi um fenômeno que não acontecia desde 2009. 

Eu acho que isso é algo que todo mundo tem que repensar porque não foi fácil passar pelo que nós passamos. A gente tem que mudar, olhar mais para o próximo.

Graças a Deus vários órgãos e os Bois-Bumbás, principalmente o Caprichoso, sua diretoria e patrocinadores, conseguiram vários ranchos para doação. Uma lição que eu tiro dessa situação é a consciência que tivemos de tudo o que aconteceu.

Temos que amar mais o próximo. Tentar perguntar o que está acontecendo, não julgar as pessoas antes de perguntar “o que está acontecendo com você, o que tá acontecendo na sua família?” 

Eu acho que isso é algo que todo mundo tem que repensar, porque não foi fácil passar pelo que nós passamos. A gente tem que mudar, olhar mais para o próximo.

Essa tempestade já está passando. Já estamos enxergando nuvens brancas, o céu azul de novo. O tsunami, o temporal, já foi. Agora estamos vendo o céu azul e, se Deus quiser, vai dar tudo certo. Se Deus quiser, vamos voltar a ter nossa vida normal de novo, mas sempre olhando para o próximo.

Você que está lendo este texto, tenha fé em Deus que tudo isso vai melhorar, tudo. Não é só aqui, para gente que mora em Parintins, o Brasil todo vai melhorar. Você visitante, quando chegar aqui em Parintins, vai chegar com aquela alegria, com aquela emoção que você pensava que não ia mais sentir. Você vai sentir porque Deus é lindo, Deus é tudo e quem tem fé em Deus vai longe. Pense nisso, Deus é tudo.

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25 a 39 anos Ensino Médio Incompleto Escolaridade Estado Gênero Idade Mulher Cis Prta Raça/Cor Rondônia

“Todas as pessoas do meu quilombo estão vacinadas!”

Graças ao divino Espírito Santo inventaram a vacina e todas as pessoas do meu quilombo estão vacinadas. Não via a hora de tomar a vacina, pois nela eu tinha a esperança do fim da pandemia. Hoje, estou vacinada com as primeira e segunda doses, graças a Deus.

Não tivemos problemas para a vacina chegar até a nossa Comunidade Quilombola do Forte Príncipe da Beira, com exceção do meio de transporte para cidade mais próxima, a Costa Marquês. Porém, no meu quilombo, tem um quartel do exército com atendimento médico e, em caso de emergência, acabavam levando as pessoas nas viaturas para a cidade.

Somos uma comunidade pequena, no entanto, muito unida. Lutamos juntos pelos direitos do nosso quilombo.

Na foto, é possível ver Nucicleide da Paz dentro de casa mostrando cartão que comprova o recebimento da vacina contra a Covid-19.  Imagem acompanha o relato: "Todas as pessoas do meu quilombo estão vacinadas!"
Nucicleide da Paz apresenta comprovante do recebimento da vacina contra a Covid-19

Com a chegada da pandemia, as crianças ficaram sem estudar. Os pequenos não podiam sair de casa. E o medo da infecção é uma das coisas mais ruins trazidas pela Covid-19. Tivemos que aprender e a lidar com a doença, que mostrou que para morrer infectado é indiferente ser rico, pobre, negro ou branco.

Acredito que aprendemos amar, ter mais respeito e compreensão com o próximo, pois não sabíamos o que seria do amanhã.

Não há mais casos de Covid no meu quilombo

Não há nenhum caso de Covid-19 na minha comunidade e, graças a Deus, não faleceu ninguém por causa dessa doença. No entanto, o período de pandemia pra mim foi muito difícil. Tive depressão e não saia de casa. Por outro lado, nos unimos ainda mais na minha comunidade.

Não perdi ninguém da minha família. Todavia, a minha mãe pegou Covid-19. Ela tem 54 anos. Cheguei a pensar que a perderia para essa doença, pois ela ficou muito mal. Então, pedi proteção ao senhor divino Espirito Santo e redobrei os cuidados com ela. Ainda bem, não fui infectada.

Por fim, a minha amada mãe se recuperou, está vacinada e muito bem de saúde. Deixo aqui o meu conselho a você que lerá o meu relato: vacine-se. Não esqueça a segunda dose nem a de reforço. A pandemia ainda não acabou, e precisamos unir forças para que esse período termine logo e possamos voltar à normalidade.

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25 a 39 anos Ensino Superior Completo Escolaridade Estado Gênero Idade Minas Gerais Mulher Cis Prta Raça/Cor

“Noventa por cento dos profissionais de aviação foram afastados”

Meu nome é Laiara Amorim. Trabalho no setor de aviação, como comissária de voo e sou graduanda em pilotagem de voo. A pandemia me afetou de diferentes formas em diferentes etapas. Este ano eu fui contemplada através de um programa de aceleração de lideranças negras e este programa consiste em acelerar minha formação como pilota. Por conta da pandemia, eu não pude cumprir minhas horas de voo e, com isso, não foi possível desenvolver o que estava previsto no programa. 

Afetou também o meu trabalho, porque a aviação ficou totalmente parada durante um período, pelo motivo de ser um ambiente confinado, pelo fato de ser um espaço muito pequeno e as pessoas ficarem muito próximas umas das outras. E o transporte está paralisado, as pessoas não estão viajando pelo medo da contaminação e pelas recomendações da agência se saúde. 

Com isso, a aviação foi muito afetada. Noventa por cento dos profissionais foram afastados, e, em algumas empresas, grande parte do quadro de funcionários foi demitido. Houve desligamentos de colegas, e eu mesma fiquei afastada do meu trabalho por seis meses. Estou retornando agora. Era um afastamento não remunerado, então a pessoa tinha que sair do trabalho e criar outras formas de subsistência. 

Novas oportunidades no setor de aviação

Em contrapartida, tive a oportunidade de trabalhar em uma companhia aérea executiva, que trabalhava com transporte de pessoas durante a pandemia, que poderiam ser pessoas infectadas ou não, e que na aviação a gente chamava de Aeromed, que era o transporte de vítimas em estado grave para outros estados para que pudessem ter o devido atendimento, bem como os familiares destas pessoas.

Então foi uma oportunidade que tive em decorrência desta pandemia, e que acrescentou muito em meu currículo, acrescentou em meu conhecimento, pois é uma parte da aviação que não conhecia, que é a parte médica. Então teve dois pontos. O ponto negativo foi ver a aviação comercial parar, ver amigos sendo demitidos, ter este afastamento, o que me gerou certa ansiedade, porque até então não sabia como me manter. 

O outro ponto foi ter o ensejo de trabalhar em outra companhia, aprendendo outra parte da aviação que não conhecia. A pandemia afetou fortemente o turismo, o que ocasionou também pré crescimento econômico, o comércio, os lugares, os hotéis, para os pequenos empreendedores também, que trabalham em feiras, qie vivem desse turismo. Então afetou de diversas formas. 

Máscara e álcool

O turismo movimenta o nosso país de diversas formas. Eu desejo que neste momento, as coisas vão retomando aos poucos, e quem tem que viajar, que viaje, que vão encontrar seus pares, sua família, que vão encontrar seus amores, que viajem, mas que mantenham sempre o cuidado, que usem máscaras, álcool, e que continuem se cuidando para que o virus não possa retomar essa segunda onda em outtos países nao venham nos atingir. 

E que o cenário seja o melhor possível para o turismo, pois movimentando o turismo, conseguimos movimentar todas as outras áreas se nosso país. Turismo é cultura e, para certos lugares, a gente só consegue ir de avião. Por isso, desejo essa melhora para que possamos voltar e enegrecer esse céu aí.

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25 a 39 anos Bahia Ensino Superior Incompleto Escolaridade Estado Gênero Homem trans Idade Prta Raça/Cor

“Foi expulsa de casa por ser uma pessoa vivendo com HIV”

Apresento a vocês, Robnete, pessoa vivendo com HIV e em situação de rua há mais de 20 anos. Uma sujeita alegre, humana, espontânea e de identidade indefinida, como a mesma costuma / costumava afirmar!

Um dia Robson, outro dia Robnete, a boa, como ela mesma costumava dizer. Nós sempre tratamos Robnete no feminino por perceber que era a forma como ela gostava de ser chamada.

Robnete, pessoa vivendo com HIV e em situação de rua há mais de 20 anos. Foto: Casa Aurora.

Robnete, com 40 anos ou um pouco mais, saiu de casa, ou melhor, foi expulsa de casa por ser uma pessoa vivendo com HIV. Na época do resultado, seus progenitores a colocaram para fora por achar que era algo contagioso só em dividir um talher.

Falta de acesso? Preconceito? Um pouco dos dois? Não sabemos ao certo, só que Rob era tão incrível… onde chegava brilhava. Sobrevivia de reciclagem, tomava umas para aquecer o corpo e ia sempre na Casa Aurora buscar leite e açúcar, dizia que era pra ficar forte para aguentar os anti retrovirais.

Acessos negados

Na pandemia, Robnete conseguiu o auxílio emergencial e alugou uma casinha, vinha de 15 em 15 dias nos dar notícias de vida, buscar comida e o que mais precisasse.

A ela foi negado o direito à moradia, à alimentação e outros direitos básicos. Tinha vergonha de andar suja, mas o coração estava sempre limpo e a alma transbordando alegrias. Como pode, não ter acesso algum e ter sempre um sorriso no rosto?

Na pandemia, Rob apareceu umas 4 vezes, tinha máscaras, mas como sobreviver na pandemia, estando em vulnerabilidade? Hoje, a esperança é que Robnete esteja viva, mas não sabemos do seu paradeiro há pouco mais de 5 meses. Então, perguntamos: a quem é permitido a vida, os acessos e a identidade? Por isso, a nossa principal questão é: em meio a pandemia, onde está Robnete?

Enfim, seguimos desejando que ela esteja viva e volte para nos dar sinal de vida, sorrindo e pedindo leite e açúcar para se manter forte. De uma coisa temos a certeza, para nós, Rob é uma pessoa de identidade, de alegria e sempre viva!

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“Que as travestilidades inspirem lutas por uma sociedade mais justa”

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25 a 39 anos Escolaridade Estado Gênero Idade Mulher Cis Pós-Graduação Completa Prta Raça/Cor Rio de Janeiro

“O governo não está garantindo o direito básico à água”

“Como higienizar as mãos, lavar a casa, as roupas, fazer comida se não tem água na favela?”, disse uma moradora da Maré, favela localizada na Zona Norte do Rio de Janeiro e com aproximadamente 132 mil moradores. E, assim tem sido os dias de inúmeros outros moradores de favelas da Zona Norte e Oeste do Rio. O pior é vivenciar isso em meio a pandemia do novo coronavírus (Covid-19), sendo a água uma das principais recomendações para que a população não corra o risco de ser contaminada pelo vírus. 

As autoridades públicas do Rio, em entrevistas às mídias, afirmaram que o abastecimento da água no município só será normalizado no final do mês de dezembro. Até o momento, só no município do Rio mais de um milhão de pessoas já está sendo afetadas. De acordo com a Cedae, são 30 bairros que estão neste momento sofrendo com a falta do abastecimento de água. 

Mas, infelizmente, sabemos que a falta d’água não começou agora nos locais mais pobres da cidade. A maioria das favelas e periferias do Rio de Janeiro nunca tiveram esse direito humano básico garantido na sua totalidade. O que se tem hoje dentro das favelas e periferias, foi construído pelas próprias mobilizações locais para sobrevivência dos que habitam este espaço. E essa cruel situação só vem se agravando. 

A luta pela água, um direito básico

Ainda no início deste ano, lá em março, quando o mundo passou pela primeira onda da Covid-19, várias denúncias sobre a falta d’água começaram a surgir em diferentes pontos da cidade. A favela do Amorim, também na Zona Norte do Rio, foi uma das que tiveram que fazer protesto na avenida para chamar atenção das autoridades públicas em relação a este grave problema. 

Os moradores só conseguiam água porque a Fiocruz disponiblizava uma mangueira para os moradores durante o dia. Uma das moradoras na época disse a seguinte frase: “Eu não consigo ir no local que dá para pegar água porque estou numa cadeira de rodas, sou idosa, estou dependo das pessoas da rua para ter água em casa”. Este e outros relatos chegam diariamente e de diferentes partes da cidade.

O nosso povo está morrendo de fome, de Covid-19, de desemprego, de sede. Enfim, a realidade na favela nunca foi fácil e, agora, em tempos de pandemia, tudo só tem piorado. Sinceramente, se isso não é genocídio, eu não sei o que é! Lutemos juntos e juntas para sobrevivermos a tudo isso!

Sou Gizele Martins, moradora da Maré, comunicadora comunitária, jornalista e mestre em Educação, Cultura e Comunicação em Periferias Urbanas. Sou ainda defensora de direitos humanos e há quase 20 anos circulo as favelas do Rio, do país e do mundo para conhecer de perto as violações cotidianas de direitos. Faço disso matéria, artigo, mobilização e muita luta cotidiana em defesa do direito à vida!

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25 a 39 anos Branca Ensino Superior Incompleto Escolaridade Estado Gênero Idade Mulher Cis Paraná Raça/Cor

“Hoje o meu quarto é minha sala de aula e lugar de estudo”

“Eu sou Tamile Rizmann Fronczak e o meu quarto agora é minha sala de aula e lugar de estudo. Sou natural de Curitiba – PR, tenho vinte e seis, e dois grandes sonhos acalentados desde criança: ser professora e conhecer Paris. Escolhi o curso de pedagogia e estou firme no propósito. Eu tenho Síndrome de Down e acredito na inclusão das pessoas com deficiências na escola regular e na sociedade. A formação universitária é uma opção minha e conta com o apoio da mãe e do pai.

Antes, já havia feito três de anos de pedagogia em uma Instituição de Ensino Superior privada. Minha mãe diz que o primeiro ano foi um investimento financeiro perdido porque a IES não ofereceu os apoios que ela precisava. Porém, foi uma grande vitória de sua tenacidade e persistência: ela se superou, provou o seu valor e ganhou paulatinamente o respeito de todos/as. Isso tudo marcado por significativo desgaste emocional e físico, inclusive. Nos dois anos que se seguiram, foram sendo adequados os apoios e os arranjos necessários para o sucesso nas disciplinas matriculadas”, conta Tamile.

Diante do quadro de instabilidade financeira familiar, em 2020 e após passar no vestibular (2019) optamos pela escola pública para que a Tamile não adiasse ainda mais a realização de seu sonho. Ela mudou de IES muito a contragosto, mas obediente. Como todo mundo, ela tem dificuldade em lidar com a mudança. Sente muita falta dos/as amigos/as e do ambiente escolar já conhecido na IES anterior.

Isolamento

Nos primeiros quinze dias de isolamento (março/2020), Tamile mostrava, pela primeira vez na vida, desinteresse pelos estudos e nenhuma vontade de retornar à universidade, por vários fatores desde a comodidade de estar em casa ou pela total falta de vínculos com a nova Instituição de Ensino.

Figura 2: Chocolate quente no café da manhã de mãe e filha

Quando chegou a primeira informação, por e-mail, sobre alguma atividade não presencial ficamos muito apreensivas com as demandas e imediatamente entramos em contato com a Coordenação do Curso e com Núcleo de Apoio às Pessoas com Necessidade Educacionais Especiais.

A nova rotina de vida estabelecida em casa era algo a ser explorado: a família toda em casa todos os dias e não só nos finais de semana éramos duas, mas essa era toda a nossa família; um pouquinho mais de tempo para dormir pela manhã; trabalho diário nas tarefas da casa: secar a louça, ajudar a preparar as refeições, arrumar o quarto; cuidar de si, desenhar, pintar, dançar, ouvir música, tomar sol pela janela; mais tempo de TV e celular também. Portanto, voltar ao ritmo de estudos parecia desgastante.

Figura 3: Tamile “sous-chef” na nossa casa – 1º semestre

Nova rotina

A partir do citado e-mail e da primeira reunião virtual com a IES  (professores e alunos) e dos contatos frequentes por telefone com quatro professoras, as dúvidas foram sendo esclarecidas e os combinados construídos. As conversas virtuais das segunda-feira foram trazendo a universidade mais para perto e o ânimo e compromisso com o estudo foi retomado. Então, Tamile passou a ler com afinco o livro indicado pela IES e presenteado pelo pai “Pedagogia do Oprimido”. Fez seus resumos e seus mapas mentais com o apoio somento das conversas familiares à mesa a partir de suas demandas.

Com o início das atividades pedagógicas não presenciais e o apoio da professora designada para acompanhá-la estabeleceu-se uma rotina e dinâmica organizadora não só dos estudos, mas também com influencia positiva no equilíbrio emocional, pois minimizava as perdas de contato impostas pelo isolamento social devido à pandemia Covid19. A chegada de um tablet emprestado pela IES também ajudou muito em toda a dinâmica.

Figuras 4, 5, 6 , 7 e 8: “Qualquer um pode cozinhar”, mas somente um paladar apurado sabe apreciar uma boa comida. Essa é a Tamile! 

Destaque na Figura 5 é o omelete preparado pela Tamile (somente com supervisão da  mãe) – 1º semestre/2020.

“Qualquer um pode cozinhar” é uma frase famosa do Filme “Ratatouille”, dita pelo Chef Gusteau como expressão de suas crenças pessoais. E nós também acreditamos que qualquer um pode realizar coisas maravilhosas, pode sim ser um artista, ser bem sucedido e alcançar os seus sonhos. O rato Rémy simboliza alguém simples e pobre, que sofre preconceito e perseguição e mesmo assim consegue realizar o seu maior sonho, contra todas as expectativas e contra todos. 

Consultado em 15/08/2020, às 14h, em: clique aqui.

Mudanças

Muitas coisas mudaram nas nossas vidas desde que participei do vídeo convocatório da Campanha Memória Popular da Pandemia. A partir de setembro/2020 a dinâmica da nossa casa mudou bastante com a chegada da Vovó Gertrudes. E o nosso espaço de vida que parecia aconchegante ficou pequeno demais.

Em novembro/2020 mudamos para Ilhéus, na Bahia. Moramos, hoje, em frente à Praia de Olivença, margeando o Território Indígena Tupinambá de Olivença. O lugar de fato é um paraíso, mas toda mudança exige um esforço nas adaptações. Vovó Gertrudes, de fato, melhorou muito.

  1. As minhas produções e a nossa vida:

Figuras 9, 10 e 11: Comemoração familiar dos 169 anos da chegadada Família Ritzmann ao Brasil – 12/07/1857 – 2020

Figuras 14 e 15: Produções artísticas da Tamile – 1º semestre/2021 

Para mim, a educação é simultaneamente um ato de conhecimento, um ato político e um  ato de arte” (Paulo Freire) 

Acesse o teaser da Campanha que contou com a participação da Tamile em: encurtador.com.br/ktwCZ

Leia também: “Minha casa e meu espaço de trabalho se fundiram em um mesmo lugar”

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25 a 39 anos Escolaridade Estado Gênero Homem Cis Idade Parda Pós-Graduação Incompleta Raça/Cor São Paulo

“A pandemia da Covid-19 aprofundou as vulnerabilidades do país”

Sermos atravessados por essa pandemia em um momento já tão difícil nos colocou em um lugar de aprofundamento de muitas vulnerabilidades. Nesse momento, o meu olhar para as pessoas ao meu redor passou a ter uma lente ainda mais forte da importância de suas vidas. A pandemia ainda não passou, e continua a ser ignorada pelos incompetentes governadores, ministros e presidente. Assistimos de boca aberta, lágrimas nos olhos e apunhalados pela indiferença a morte de centenas de milhares de pessoas. E o punhal da indiferença nos mata enquanto seres humanos cada dia mais um pouco, enquanto a política econômica neoliberal avança e temos nossos direitos violados, aprofundando a precariedade e vulnerabilidades de nossas vidas.

No início do ano eu já lia com muita tensão as notícias sobre o novo vírus que havia surgido na China. Sabia que algo grave estava por vir, com notícias indicando possíveis impactos socioeconômicos. Olhei para as condições financeiras na qual estávamos eu e minha parceira, uma travesti que vive com HIV, que também estava sem emprego formal, vendendo o almoço para comer a janta. Mas ainda tínhamos a possibilidade de pagar o aluguel.

Não éramos os únicos, a situação de quase todes que conhecíamos era a mesma ou até pior. A atenção para as tensões já presentes no cotidiano se aprofundou com mais uma ameaça de aumento de crises. Em fevereiro, eu e minha parceira fortalecemos mais uma vez o laço de parceria, cuidado e muita paciência. Foram meses tensos e estávamos sozinhes dentro de casa.

Vulnerabilidades escancaradas

No que concerne ao meu trabalho, assisti com um peso no coração os projetos de prevenção e promoção da saúde minguarem com o fechamento das escolas. As vulnerabilidades foram escancaradas. Nos últimos encontros presenciais vi nos olhares daquelas e daqueles estudantes o receio de mais um terremoto em suas vidas: uma pandemia que trazia expectativas – que infelizmente se realizaram – de centenas de milhares de mortos. Esses jovens são moradores e moradoras de favelas, e já diziam: a gente é quem mais vai se ferrar com isso.

Ouvi na voz de professoras queridas a força de continuar se movimentando pela garantia do direito a uma educação de qualidade, seguido do pesar de reconhecer o fracasso das políticas instituídas pelo estado para a continuidade das aulas. Os/as estudantes não estavam conseguindo acompanhar, e, ainda pior, o contato com muitos/as deles/as foi perdido.

Direitos violados

Os trabalhos de prevenção ao HIV e outras IST ficaram ainda mais difíceis nas escolas. Esse assunto não estava sendo abordado no currículo oficial com as aulas online, e a possibilidade de registro audiovisual de professores/as falando sobre esse tema em meio ao turbilhão de políticas conservadoras apenas aumentou o medo já existente de abordagem do assunto. Pois, essa violação ao direito desses jovens a uma educação sexual baseada em evidências aprofundaria ainda mais suas vulnerabilidades à AIDS.

Em outros projetos com movimentos sociais junto a jovens para trabalhar a prevenção experenciei o enfraquecimento de vínculos tão duramente trabalhados nos últimos tempos. O contato com esses jovens foi extremamente dificultado pela violação do seu direito a uma conexão de internet, além de suas vidas terem mudado de rumos em poucas semanas, sendo forçados/as a procurarem formas para ajudarem suas famílias a continuarem se alimentando e pagando suas contas. Todo o resto ficou em outros planos para depois. Mas continuamos com o trabalho, tentando fomentar a discussão sobre a importância dos direitos humanos e, principalmente, a garantia desses direitos.

Incertezas

Após sete meses sem visitar meus familiares, fui para o interior de São Paulo, carregado de uma grande tensão, um medo muito grande de poder estar levando o novo coronavírus para lá. A dinâmica de interações naquela pequena cidade é muito diferente da de São Paulo, com muitas visitas diárias de parentes e conhecidos na casa de minha mãe. No entanto, consegui me manter em isolamento durante quase duas semanas antes de entrar em contato com essas pessoas.

As minhas diversas tentativas de comunicação sobre a importância de manter distância física e usar máscara falharam miseravelmente. Por isso, me senti um péssimo trabalhador da saúde na área da prevenção.

Mas era tudo muito novo e eu não daria conta dos medos e certezas baseadas em centenas de notícias e informações falsas das mensagens de WhatsApp que apitam o dia todo nos celulares de minhas tias, por exemplo. Certezas que são baseadas na primeira reação emotiva frente a uma notícia absurda se endurecem rápido, ficam sólidas e destrutivas. Enfim, qualquer contestação é recebida com agressividade. São efeitos do fundo buraco político da ascensão neofascista no Brasil.

Sou psicólogo, trabalho com prevenção ao HIV/AIDS em escolas públicas de São Paulo através de projetos da USP. Também faço parte da Coletiva Loka de Efavirenz. Este é um breve relato sobre minha vida pessoal e profissional durante o início da pandemia de Covid-19 na cidade de São Paulo.