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Para o futuro, quero assinar a minha carta de aposentadoria

Me chamo Dona Fátima, tenho 64 anos e nasci no Igarapé de Nhamundá. Me mudei para Parintins só quando meu pai comprou uma casa. E eu estou aqui até hoje. 

Eu tive 10 filhos, mas alguns já são crescidos, então hoje em dia eu tô só com 3 meninas e  uma neta. Uma das minhas filhas mora em Manaus, e eu, sempre morei por esse pedaço, conhecido como o reduto do Boi Caprichoso, no lado azul da cidade perto do porto. 

Memórias do Boi e da cidade

Contudo, eu não lembro do Boi desde a sua fundação, pois, já pegara aquela animação já andando, no meio do caminho. Antigamente, eu nem me metia nisso, mas, as meninas novas da cidade sempre iam para o Boi, já eu, ficava um pouco de fora. Mas agora, depois de tudo, eu não quero perder nenhum ensaio.

 Em algumas memórias, lembro do Boi brincando na rua, na época da lamparina. Era uma briga, tanto que até tinha pedra no meio. A gente andava por toda a cidade, sempre no meio da rua. 

Hoje, vou sempre para os ensaios e festas do Boi, principalmente para torcer por ele — inclusive, vou para as festas, mas não danço. Minha filha, Darley, sempre esteve trabalhando nas alegorias do Boi. 

Às vezes eu penso sobre outras famílias que perderam entes queridos…

Nestes tempos conturbados, a pandemia levou muito gente, mas, graça a Deus, não levou ninguém da minha família. Às vezes eu penso sobre outras famílias, que perderam seus entes queridos fora da hora, fora do momento — triste. 

 A minha vida durante a pandemia foi somente em casa. Eu ia para a pia, levava a máscara e álcool em gel, não saía de lá. Quando saia, tomava banho, e sentada, ficava pensando em quem já se foi. A minha mãe partiu durante a pandemia, mas não por conta do vírus, ela se foi por causa de um câncer. Cuidei dela até o final de sua vida, chegando a falecer aqui em casa.

O futuro…

Para o futuro quero assinar a minha carta de aposentadoria, que resta, somente, a minha assinatura para eu já poder receber o meu benefício. Hoje, fiquei com a casa que meu pai comprara. Quero arrumar toda a casa para ela ficar bonita!

Além disso, estou ansiosa para a volta do festival do Boi!

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“Eu sou vigia aqui do Caprichoso desde 2015, quando essa doença chegou”

Meu nome é Jorge Oliveira dos Santos. Tenho 69 anos e farei 70 em janeiro, se Deus quiser.

Sou vigia do Caprichoso desde 2015, e vou dizer para você: “não é fácil não” — tudo parou, as coisas ficaram muito complicadas. E para piorar, nessa época minha mulher estava em Manaus e eu estava aqui. Eu pensava assim: “ela pra lá eu pra cá”. Se eu adoecesse aqui, ela não podia vir para cá, e se ela adoecesse lá, eu não podia ir para lá”. 

Todas essas coisas se passavam pela minha cabeça e eu sempre perdia o sono. Em alguns momentos eu só dormia um pouquinho, “na boca da noite”, e de madrugada eu ficava pensando todas essas coisas, sabe? Aí eu pedia tanto para Deus que nos desse força, que nos livrasse de todas essas doenças, não só na minha família como em todas as outras. Mas essa doença tirou muita gente, muitos colegas nossos. Até minha irmã, que morreu em Manaus, três dias após eu completar 69 anos. E assim foi… levando as coisas e, até hoje em dia, eu não assisto televisão direito. Às vezes um pouquinho de jornal, um pouquinho de jogo, aí quando vejo aquelas notícias da doença, opto por não assistir mais à televisão.

Tudo parou

Então, tudo parou né!? Aqui nesse galpão a gente olha de um lado para o outro e não se vê ninguém como antigamente — já que minha trajetória de Caprichoso se iniciou em 1996. Lá trabalhei como soldador, e depois que chegou essa doença, acabou tudo. Muita gente tem falta disso, pois, quando terminada o Boi, eu viajava para São Paulo e Rio de Janeiro. E devido à paralisação, eu ficava sem ganhar esse dinheiro. 

Os artistas e soldadores vivem desse trabalho de vai e volta, e assim fica. Então, agora eu espero, se Deus quiser que eu continue trabalhando. Eu, com muito cuidado sempre, chegava em casa, já tomava muito cuidado, muito remédio — que era dividido entre filhos e irmãos — e máscara. Eu não tiro a máscara por nada. No Galpão, mesmo sendo só eu e o meu colega que não está lá diariamente, eu nunca tiro a máscara — tirei só agora para dar essa entrevista. Só tiro para beber água, comer algo, mas depois eu boto de novo.

Eu espero que tudo volte ao normal, porquê esse vírus não é. Depois que eu tomei a primeira dose da vacina, antes de inteirar os 3 meses, a enfermeira ligou para mim, que já estava com mais de dois meses, pedindo para retornar e tomar a segunda dose. E, se Deus quiser, agora dia 8 eu tomo a terceira dose já de novo, se Deus quiser. Tenho fé em Deus que tudo vai passar, que tudo vai voltar ao normal, se Deus quiser, tenho fé em senhor Jesus.

A festa do Boi Caprichoso

Assistimos a  live do Bumbódromo, e já deu um alívio mesmo não sendo como a festa que a gente ia. Então, a live já me deu mais uma esperança. Voltando a falar brevemente sobre a minha irmã, mesmo ela se cuidando, ela foi embora. Apesar disso, creio que as pessoas, nesses tempos de pandemia, passaram a dar mais atenção e carinho para as suas famílias — o que é ótimo. 

Agora, pensando, esse momento foi bem difícil, né? Mas, felizmente, trouxe bastante aprendizado para as pessoas. Hoje em dia, a gente fica mais alegre, pois eu saio na rua para ir ao trabalho e depois volto para a casa. As pessoas já estão andando mais, circulando pelas ruas. E eu espero que, se Deus quiser, que em 2022, já vai ter o festival, e isso vai ser um alívio para muita gente. 

O festival do Boi é um evento muito importante para as pessoas da nossa cidade, trazendo venda e lucro para nós.

Vai passar…

Termino esse relato agradecendo, e dizendo que aprendi muito com essa doença que circulou na nossa cidade. Se cuidar e ter o maior cuidado, como, por exemplo, chegar em casa e já ir direto para o banho, para depois entrar em contato com a minha família. Eu já não chego mais em casa como antigamente. 

Espero que, mesmo após ter tomado a vacina, as pessoas continuem se cuidando.

E quem não tomou a vacina, que procure um posto de saúde!

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25 a 39 anos Amazonas Branca Homem Cis Pós-Graduação Completa

Fizemos muito durante a pandemia e só paramos nos momentos mais graves

A essa altura já estava bastante envolvido, mas vi o Festival pela internet por conta da pandemia. E em 2020 e 2021 não teve Festival. Então nunca passei por um Festival como Conselho, de verdade, na arena.

Meu nome é Diego Omar da Silveira. Sou professor da Universidade do Estado do Amazonas, aqui em Parintins, na divisa do estado com o Pará. Cheguei aqui há quase dez anos, na minha aventura amazônica. 

Quando vim, recém-aprovado no concurso, tudo era muito novo. Desembarquei aqui com meu filho – apenas eu e ele – e era uma nova vida que começava. De lá para cá, muita coisa mudou. Conheci já nos primeiros dias a Priscila, minha companheira, com que estou desde então e com quem tive uma filha, a Maria Bethânia, uma menininha amazonense. Aos poucos fomos construindo juntos uma vida.

 Gosto da cidade e desde cedo achei a festa dos Bois rica e interessante. Demorou um pouco para que aquilo me interessasse como tema de pesquisa ou como um lugar de atuação. Mas tudo se encaminhou para que eu escolhesse o Caprichoso… na verdade, a minha chegada se deu em uma “semana azul” – como dizem aqui, quando toda a cidade se preparava para a gravação do DVD do Centenário do Caprichoso, em 2013. Tudo muito lindo e que me capturou.

Sou Caprichoso e não pretendo mudar

Desde então sou Caprichoso e não pretendo mudar. Na medida em que comecei a guinar meus temas de pesquisa fui me aproximando mais do Bumbá também. Sempre gostei do ambiente, da construção, das referências sonoras e estéticas do Caprichoso. Elas têm uma brasilidade que escapa ao contrário e, talvez por isso, sempre me senti muito acolhido aqui. Mas fiquei uns anos sendo apenas torcedor mesmo. 

Fui conhecendo as pessoas, orientando alguns trabalhos, lendo a bibliografia sobre folclore e Boi-Bumbá, mas sem muitas pretensões. Os contatos com quem fazia o Boi nunca foi muito próximo até 2017, acho. Foi quando conheci o Ericky Nakanome e passamos a trocar algumas ideias.

Em 2018 ele me convidou para olhar alguns textos, num exercício de revisão e no final daquele ano me chamou pra fazer parte do Conselho – foi um susto e uma alegria. Ajudei como pude em 2019, em meio a um momento familiar difícil, já que a minha filha faria uma cirurgia de relativa complexidade às vésperas do Festival e em Brasília.

Imprevistos da pandemia

Esse “título” foi entregue aos Bumbás em 2019 e depois não teve mais festa. Mas tínhamos que pensar em políticas de salvaguarda, precisávamos dialogar com a sociedade e começamos a discutir estratégias. Vieram as lives e, depois, com a Lei Aldir Blanc, a ideia de publicar alguns livros e organizar o Centro de Documentação e Memória do Boi. Tiramos nossas intenções do papel e isso permitiu, inclusive, que a gente fizesse o registro da memória das pessoas ligadas ao Caprichoso nesse edital da DHESCA Brasil. 

Como a gente já estava construindo um banco de memória, esse se tornou um projeto paralelo. E é isso… estamos nessa luta. Quando o Caprichoso suspendeu o funcionamento de todos os setores para que a gente evitasse os riscos e não colocasse ninguém em risco. 

Mas discutimos muito nossos projetos, aprofundamos as pesquisas, pensamos nossa história e articulamos os livros que estão saindo agora, nesse fim de ano. Foi difícil ver a situação dos artistas, dos trabalhadores do Boi de uma forma geral. Muita gente do setor da cultura ficou desamparada – mas travamos juntos essa batalha. E a ideia é continuar… O CEDEM tem uma tarefa enorme pela frente e queremos tratar com mais carinho a memória do Boi. 

Não vamos parar de receber, tratar e divulgar esse enorme legado que ainda é pouco visibilizado.

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Essa pandemia foi muito difícil para nós

Quando começou essa pandemia, a gente recebeu ajuda da CONAQ, que é uma associação nacional que ajuda as comunidades quilombolas e da UNICEF. Nós conseguimos ranchos para a nossa e outros comunidades no Amazonas. Conseguimos máscaras, álcool em gel. O que a gente tínhamos de sobra na comunidade acabamos doando para outras que estavam com poucos recursos.

Meu nome é Jamile Souza da Silva, tenho 45 anos, sou analista de comércio exterior. Hoje estou como atual organizadora dos festejos de São Benedito, no quilombo do barranco de São Benedito. Sou quilombola e represento como líder a comunidade desde a certificação. Realizamos um trabalho social na comunidade juntamente com a nossa Associação Crioulas do Quilombo de São Benedito, onde começamos trabalhando somente com artesanato, e hoje, realizamos um trabalho mais amplo com as crianças e com as famílias da comunidade.

Falar sobre o Boi é falar sobre os mais antigos da nossa comunidade

O vovô Raimundo Nascimento Fonseca, lá no Maranhão, já tinha o seu Boi, que era o Caprichoso. Um boi todo malhado, que ele trouxe para Manaus na bagagem, juntamente com São Benedito. Então, esse amor que a comunidade do quilombo do São Benedito tem pelo Caprichoso, se transformou também no amor do Boi Caprichoso que acabou sendo transferido para Parintins.

Tanto que, a cada vitória do Caprichoso em Parintins, a gente lembra muito dos antigos que soltavam fogos e comemoravam. Em 2018, a gente teve um contato bem mais próximo, quando o Babá Tupinambá assumiu o Caprichoso e foi falar um pouco sobre a cultura negra – convidando-nos a fazer parte da toada “Boi de Negro.

A pandemia levou pessoas queridas do nosso quilombo

Eu, na minha família, perdi a minha irmã, que morava no Rio de Janeiro, e veio na comunidade pra ajudar a cuidar da nossa mãe, que teve um AVC. E, nesse período que ela esteve aqui, foi internada – ela acabou se infectando. Passado um mês minha irmã veio a falecer.

Na nossa comunidade perdemos minha irmã e meu primo – foi muito difícil esse momento.

Graças a Deus a gente conseguiu ajudar muita gente. Mas foi, assim, bem difícil, e, de certa forma, ainda é doloroso. Nós conseguimos que a comunidade fosse vacinada. Por mais que o governo tenha feito aquela portaria, onde as comunidades tradicionais e quilombolas fossem tratadas como prioridades, não foi fácil. A gente só conseguiu através do Ministério Público Federal. Porque, para você ter uma ideia, a SEMSA, que é a Secretaria Municipal de Saúde, apesar de ter proximidade com a nossa comunidade, eles simplesmente disseram que não tinha nada para a nossa comunidade. Não tinha vacina pro quilombo urbano, somente para os quilombos do interior.

Então, fizemos um ofício, denunciando no Ministério Público, e assim, a gente conseguiu com que a nossa comunidade fosse vacinada em abril de 2021.

Esperanço do pós-pandemia

Bem, tudo o que a gente espera para o futuro é um espaço de muito acolhimento e cuidado. Essa pandemia ainda não parou, ainda continua, e ainda temos um certo medo. Continuaremos com os protocolos de segurança e, pelo visto, isso vai ser para o resto da vida, enquanto não houver um medicamento que sane esse vírus.

Na semana da Consciência Negra, a gente vai abrir a comunidade para as pessoas visitarem, principalmente o estande das criolas, que estava fechado durante toda essa pandemia. A gente vai ter a festa do dia 20 de novembro, mas não vai ser uma festa como era anteriormente. Só vai ter mesmo a feijoada e o samba no pagode do quilombo, que é administrado por mim. Para que as pessoas conheçam lá um pouquinho da nossa comunidade

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A pandemia afetou as mulheres indígenas

A pandemia chegou e não conseguimos mais ter esse lucro de vendas. E, também, nós da comunidade, para tentar prevenir à Covid-19, acabamos usando muitos remédios caseiros, como raízes, sementes, plantas e folhas.

Meu nome é Gabriele Maraguá Otero, sou do povo Baré. Meu nome indígena é Yra, que significa mel. Sou do município de São Gabriel da Cachoeira (AM), um município onde há a maior predominância de indígenas do Brasil. Onde têm 23 etnias. Eu nasci e cresci no meio da Amazônia, perto do Rio Negro e nos verdes da Amazônia.

Defendo o meu povo como uma Yauaretê, como uma onça. Não só o meu povo, mas as 23 etnias. Sou Técnica de Enfermagem e, atualmente, eu estudo teatro. Sou do Corpo de Dança – CDC Caprichoso, sou ativista e defendo a causa das mulheres artesãs indígenas. No meu município não tem festa de Boi, lá as festas são organizadas por tribo: tribo Baré, tribo Tukano e tribo Filhos do Rio Negro.

Para eu amar o Boi, do jeito que amo hoje… é uma longa história.

Cheguei aqui em Manaus em 2017, e um amigo me chamou pra eu fazer parte da Raça Azul. Eu queria viver essa experiência, queria conhecer mais o Boi. E eu fui lá, participei da galera… e fui amando cada vez mais. E hoje, eu sou uma das dançarinas do CDC. É muito lindo escutar música de Boi, escutar um ritual, os maracás, as flautas, as histórias, contos e lendas, ainda mais as lendas que são esquecidas – aí o Boi levanta e traz a identidade dos povos indígenas.

Eu achei isso muito lindo.

A música do Boi traz a originalidade de cada povo, de cada nação. Nosso passo, em São Gabriel, é um passo tribal, o nome que eles falam aqui é o Oca-Oca, – e para eu aprender foi uma dificuldade imensa.

Eu tive que ensaiar muito, mais ou menos um ano, pra eu poder pegar o gingado, o bailado. Eu ia fazer o teste e falei para a coordenadora, Edinalda. Disse que eu não tinha tanto esse movimento. E ela falou com um amigo dela, o Carlos Vieira, para me ensinar um pouco do ritmo de Boi. Aí foi quando eu fui aprendendo e me adaptando com o gingado, ficando mais solta a jogada de perna.

 A partir disso comecei a me desenvolver na dança. Atualmente, eu moro na comunidade Parque das Tribos, primeiro bairro indígena de Manaus, onde existem mais de 30 etnias. Lá existem as etnias Toto, Munduruku, Tukano, Baré, Dessana e diversas outras.

A pandemia afetou diversas pessoas do meu povo

A pandemia afetou as mulheres indígenas, os senhores artesãos e trabalhadores em vendas. As pessoas que vivem de vendas e artesanato precisam ir para à cidade divulgar e vender os seus produtos. É uma das únicas formas de conseguirmos nosso sustento.

Infelizmente, aqui na comunidade, tiveram várias mortes por causa da Covid-19, como a do nosso Cacique Geral, Messias Kokama – que logo no começo da invasão da comunidade lutou com os policiais do começo ao fim.

Entramos em pânico.

Como é uma doença nova, ninguém sabia como fazer e o que fazer. Nossa única opção era evitar que nosso povo pegasse a doença.

Ainda não estamos em 100%, mas estamos em 40, 50%. Dessa forma, vamos evitar a exposição, usar máscara e colocar álcool em gel.

Ainda espero que, logo quando tudo isso acabar, nós possamos nos abraçar e nos reunir novamente para cartar, dançar e receber aquele calor forte que só o Boi Caprichoso possui.

Se reunir, e todo mundo vacinado, para podermos curtir sem nenhuma preocupação.

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“A pandemia e a enchente em Parintins nos colocou diante da realidade”

Meu nome é Josias Silva, tenho trinta e dois anos e sou natural de Manaus. Há três anos resido em Parintins e em todos eles tenho me dedicado, exclusivamente, à Associação Cultural Boi-Bumbá Caprichoso.

Durante esse tempo todo, tivemos felicidades e também muita tristeza, com a chegada da pandemia. Ela pegou todo mundo de surpresa. Infelizmente experimentamos mais a dor da perda do que algum ganho. Ficamos de resguardo em nossas casas, praticamente presos, sem poder fazer nada, sem poder respirar. Infelizmente perdemos muitos amigos e familiares. Porém, com a chegada da vacina, tudo pode voltar ao normal. Não totalmente, mas aos poucos a gente vai voltando ao normal. 

Durante a pandemia, ainda com o cenário de mortes, eu pude ter uma felicidade: a chegada da minha filha Luna, que foi o presente que Deus me deu. Ela é o amor maior da minha vida, a maior felicidade que eu tive.

“Essa fama de o Caprichoso ser o “Boi da elite” é falsa. Na realidade, de perto, vimos as dores, as necessidades do povo da nação azul e branca”

De cara com a realidade: pandemia e enchente em Parintins

Em relação ao Boi Bumbá Caprichoso, o que eu tenho a dizer é só felicidade. Porém, enfrentamos a pandemia e a enchente em Parintins e isso nos colocou frente a frente com a realidade do povo Caprichoso. Essa fama de o Caprichoso ser o “Boi da elite” é falsa. Na realidade, de perto, vimos as dores, as necessidades do povo da nação azul e branca. 

Com a enchente e a pandemia, muitas pessoas que trabalham com artes no Boi-Bumbá Caprichoso não puderam elaborar seus projetos e, com isso, não puderam ter dinheiro para sustentar suas famílias. Então o Boi Caprichoso fez várias ações, como o evento do dia das mães e as atividades com o povo que mora na região alagada pela enchente. Levamos o Boi até as pessoas que sofreram com o isolamento da pandemia para dar um pouco de alegria e esperança. 

E como eu falei anteriormente, a vacina nos trouxe esperança. Há pouco tempo, tivemos uma festa no curral do Boi-bumbá Caprichoso. Nela, pudemos extravasar, dizer que, felizmente, a vencemos, estamos vencendo. Foi aquela mistura de sentimentos: ao mesmo tempo em que a gente estava feliz, extravasando, por estar todo mundo vacinado, também sentimos tristeza por aqueles que já não estão com a gente porque morreram de Covid-19.

Eu peço a todos aqueles que ainda não se vacinaram que se vacinem. A vacina é a única esperança que a gente tem para voltarmos à normalidade. Também peço a você que se vacinou que continue se cuidando: dê conselhos para os amigos e familiares que não se vacinaram para se vacinarem. A vacina é a única esperança que temos de dias melhores.

Temos que ter consciência de tudo aquilo que perdemos e deixamos de valorizar para que possamos, novamente, ver o brilho de nossa festa. Temos que dar mais valor aos outros, ter mais amor em nosso coração e união. 

Espero que em 2022 tenhamos vitórias, prosperidade e que seja um ano de vitória também para o nosso Boi-Bumbá Caprichoso, com a realização do Festival, no qual trabalhadores possam voltar aos galpões e levar o sustento para suas famílias.

Volta do Festival só com vacinação

Estou muito feliz por fazer parte dessa família do Boi Caprichoso e só com a vacina podemos realizar o próximo Festival Folclórico de Parintins e, com ele, fazer com que a economia do nosso município volte a crescer. 

Espero que essa vida [de pandemia] tenha ficado para trás e que, com a vacina, possamos ter dias melhores. Espero que em 2022 tenhamos vitórias, prosperidade e que seja um ano de vitória também para o nosso Boi-Bumbá Caprichoso, com a realização do Festival, no qual trabalhadores possam voltar aos galpões e levar o sustento para suas famílias. Espero que seja um ano de muitas vitórias para nação azul e branca.

Por isso, vacinem-se, continuem se cuidando, cuidem de suas famílias, de seus amigos para que a gente possa se encontrar nesse festival de 2022, que promete ser um dos melhores.

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“A pandemia ainda não passou e pode voltar a seu estado mais crítico”

Eu sou Maria Auxiliadora Pereira e Silva, mais conhecida como Dora Caprichoso. Trabalho no Curral [da Associação Cultural Boi-Bumbá Caprichoso] há vinte anos. Comecei [no setor de] serviços gerais e hoje sou diretora do Curral, desde 2016.

A pandemia me trouxe uma tristeza muito grande pois fui obrigada a me ausentar do Curral. Passar meses fora daqui foi a maior tristeza que senti. Fiquei muito abalada quando vi as pessoas morrerem e deixei de assistir o jornal. Foi um desespero, fiquei muito nervosa e acabei trazendo isso para a minha vida. 

Agora já estamos vivendo momentos melhores e espero que não voltemos mais àquela situação. Ainda que o momento mais crítico da pandemia tenha passado, a gente continua a sentir tristeza pelas pessoas que morreram e, dessa forma, a pandemia deixa marca. Perdi amigos queridos e isso me entristece muito. Eu não gosto muito de falar porque sinto uma dor muito grande no meu coração. 

Espero que isso [a pandemia] termine definitivamente. Por ser uma cidade pequena, Parintins foi bastante afetada. Pessoas como eu ficaram desesperadas por não poder trabalhar.

Minha experiência na pandemia

Quando chegou em agosto de 2021, o presidente [do Boi Caprichoso] me perguntou se era hora de voltar ao trabalho e eu retornei ao Curral porque já não aguentava mais o sofrimento de ficar em casa sem poder fazer nada. Muitos sócios queridos do Caprichoso morreram e ao ficar em casa, sem poder fazer nada, me deixava ainda pior. 

Eu espero que, daqui para frente, tudo volte ao normal. Espero que possamos viver como antes, com alegria, com festas. Quero poder passear, tirar um dia para lazer sem a preocupação de não poder estar em determinado lugar por causa do Covid-19.

“A pandemia ainda não passou e pode voltar a seu estado mais crítico, mas se a gente se respeitar e continuar usando a máscara, a gente vai ter um final muito feliz.”

Eu também espero que as pessoas se respeitem uns aos outros, que continuem usando máscara até que tudo isso passe. Se todos colaborarem, a pandemia acaba. Espero que, na idade que estou, não presencie mais uma pandemia dessas. Ela foi tão triste para nossas vidas. Não só pra mim, para todos.

Agora em diante, gostaria que todo mundo respeitasse uns aos outros, continuasse se distanciando, usando máscara, se prevenindo. A pandemia ainda não passou e pode voltar a seu estado mais crítico, mas se a gente se respeitar e continuar usando a máscara, a gente vai ter um final muito feliz.

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“Ainda que faltem algumas pessoas, voltaremos a nos emocionar com a reabertura das atividades do Caprichoso

Eu sou Felipe Souza, tenho 23 anos e atuo no Boi-Bumbá Caprichoso há muitos anos. Comecei na Escolinha [de Artes] do Caprichoso cursando percussão. Com o tempo me apaixonei por figurinos de Boi.

Em 2017, aos 17 anos, recebi uma proposta de um amigo para trabalhar como ajudante no Caprichoso. Foi uma experiência muito diferente, eu me senti um pouco realizado ao fazer parte do Festival de Parintins. Em 2018, continuei trabalhando com ele e, no ano seguinte, me convidaram para trabalhar como figurinista: foi mais do que um sonho realizado. Trabalhei com figurinos de ensaio técnico para Cunhã-Poranga [a mulher mais bela da tribo] do Caprichoso, fazendo vários acessórios para ela e foi então que meu nome começou a ser visto.

“O Caprichoso ajudou muito a gente na pandemia com a distribuição de cestas básicas”

A pandemia e os eventos on-line

Em 2020 veio a pandemia e nos obrigou a ficar em casa. Foi um momento muito difícil para a vida de muitos artistas e de muitas pessoas que perderam seus entes queridos.

O Caprichoso ajudou muito a gente na pandemia com a distribuição de cestas básicas e graças a Deus a minha família não foi afetada e não perdemos nenhum ente querido. Porém, lamento por todas as pessoas que perderam.

Pensávamos que até o final de 2020 as coisas melhorariam. Como o Boi Caprichoso não podia fazer eventos abertos ao público, nós fizemos lives como uma maneira de trazer o Boi-Bumbá para dentro das casas das pessoas, com diversão de forma segura. Foi durante esses eventos que meu nome começou a ser mais conhecido. 

Na live do Festival, por exemplo, eu e meu amigo fizemos a roupa da porta estandarte, Marcela Marialva, e a roupa muito comentada. Fiz uma roupa para Marcielle também, que foi bem falada pelo público e assim o meu nome começou a aparecer. Foi uma felicidade muito grande para mim.

“Apesar das tristezas, das perdas, eu também tive os meus momentos de felicidade. Foi, por exemplo, ver o meu nome sendo reconhecido pelo público, pelas pessoas que admiram o meu trabalho”

2ª onda da pandemia: reconhecimento do trabalho

Quando achávamos que voltaríamos ao normal, veio a segunda onda da pandemia, que afetou muitas famílias e, novamente, tivemos que ficar em casa para nos proteger. Neste ano fizemos a live do Festival 2021 e nela eu estreei como figurinista solo do Patrick Araújo, que é o atual levantador de toadas. Esse figurino ganhou o prêmio de “figurino destaque” no Caprichoso e eu fiquei muito feliz pela oportunidade. 

Apesar das tristezas, das perdas, eu também tive os meus momentos de felicidade. Foi, por exemplo, ver o meu nome sendo reconhecido pelo público, pelas pessoas que admiram o meu trabalho. Eu gostaria muito de agradecer a Deus por eu estar aqui e ao Caprichoso por ter me dado essa oportunidade.

Espero que em 2022 possamos nos reunir com a família Caprichoso no Curral Zeca Xibelão e fazer um grande evento com muitos torcedores apaixonados”

Aprendizado: é preciso valorizar o próximo

Com essa pandemia eu aprendi que é importante valorizar o próximo, valorizar minha família, cuidar das pessoas que eu amo. Percebi que o amanhã só pertence a Deus e que nós precisamos nos cuidar. 

Temos que continuar nos cuidando, usando máscara, álcool gel porque ainda não acabou. Por isso, quem ainda não se vacinou, deve procurar uma unidade de saúde para se vacinar. As vacinas salvam vidas.

Logo logo essa pandemia vai acabar e vamos nos reunir novamente como antes. Ainda que faltem algumas pessoas, voltaremos a nos emocionar com a reabertura das atividades do Caprichoso

Espero que em 2022 possamos nos reunir com a família Caprichoso no Curral Zeca Xibelão e fazer um grande evento com muitos torcedores apaixonados. Que neste ano consigamos nos unir e fazer um festival maravilhoso e que os artistas possam trabalhar e conseguir o dinheiro que todo mundo conseguia quando nós tínhamos o nosso Festival antes da pandemia.