“Me aproximei oferecendo o celular para fazer o pedido de auxílio emergencial do governo”

Memória de Luciana Paiva Coronel

Professora - Porto Alegre, RS
M

Moro num apartamento térreo de frente. Os papeleiros vinham pegar o lixo seco. Me aproximei oferecendo o celular pra fazer o pedido do auxilio emergencial do governo.

Muitos não tinham documentos, mas pediam água para beber e lavar as mãos. Então, passei a pegar máscaras com um amigo militante e aproveitava para oferecer.

Às vezes, alguns voltavam com os documentos e eu fazia o cadastro do auxílio emergencial. Assim, passei a ter sempre pão e frios para oferecer.

A rotina dos dias da coleta seletiva tem sido sempre de visita, porque faço o acompanhamento dos pedidos, que seguem “em análise”. Criamos uma rotina de apoio. Dou álcool e máscaras sempre que posso. Conversamos enquanto lavam mãos, ou aguardamos o registro dos dados para acompanhar os pedidos.

Eles me fizeram sentir menos sozinha nessa pandemia. Precisei viajar e fui de coração apertado: como iam fazer pra lavar mãos e acompanhar pedidos de auxílio emergencial?

Quando voltei, o Luís me saudou, dizendo que sentira a minha falta. Ri, e brinquei que ficar sem beber água e de mão suja é bem pior. Ele, meio sem jeito, falou que não era só isso; que era muito bom ter alguém pra conversar.

No pós-pandemia, inverter o sentido

Um dia, quando o isolamento terminar, queria fazer o trajeto de volta às suas casas ou à rua com eles. Saber onde moram e como vivem. Inverter o sentido dos passos que os traz até minha casa para conhecer um pouco mais da cidade que não vemos e não conhecemos.

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